Reinação pré-modernista

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

por Lívia Pereira


Quem, ainda hoje, passa por beiras de estrada de terra e vê casinhas brancas de varanda na frente e vovó na cadeira de balanço, não escapa da história atemporal de Monteiro Lobato.

Não é difícil, por exemplo, encontrar no trabalho, na escola, ou até mesmo no trânsito, um "cara de coruja". Mas há quem diga que pode ser ainda pior se você encontra um "cara de corujíssima seca" atravancando seu caminho.

Monteiro Lobato, nascido em Taubaté, no Vale do Paraíba paulista, perdeu sua nacionalidade territorial e passou à mundial através de suas obras. Aproximou-nos de questões reais como o campo, a imaginação, a universalidade das histórias. Enquanto a maioria dos escritores da época falava sobre natureza tocando os pés na cidade, Monteiro Lobato pisava a terra para depois escrevê-la.

Com seus bichos que falavam, peixes que caminhavam sobre terra firme, avós que ensinavam e pássaros que passarinhavam, ele fez o mundo do simples, do que poderia ser de verdade, se nós quiséssemos.

“Coitado nada! Rabicó precisa levar uma boa esfrega.” Pai de uma psicologia nada cheia de afetações, se é pra apanhar, que apanhe mesmo. E se usassem metade de seus “estudos científicos sobre o comportamento humano” e aplicassem ao nosso país, as coisas certamente se ajeitariam com mais rapidez.

Pois que no mundo em que ele viveu e criou não havia a falta de solidariedade, desde os quitutes da Tia Nastácia, tão prontamente feitos às crianças e seus convidados de fábulas e brinquedos até o companheirismo dos personagens que, mesmo cercados de diferenças, veem-se como iguais. Não importa se a boneca é de pano com olhos de retrós, nem se o João Faz-de-conta tem prego nas costas, muito menos se o guia ao País das Fábulas é invisível.

O que importa de verdade e o que fica é que num mundo com tantas diferenças, o que nos faz permanecer juntos é a ideia de que podemos ser o que quisermos, mas que seremos ainda melhores se permanecermos juntos. Não nos importando com as tagarelices das “Emílias” que surgirem no nosso caminho, com os devoradores “Rabicós” que surpreenderem nossas geladeiras e se acovardarem diante da rotina, com os afobados e inventivos “Pedrinhos” que nos cercarem tentando abraçar o mundo ou até mesmo com “Narizinhos arrebitados” que nos façam prestar atenção aos pequenos detalhes.

O fundamental é isso: unir cada linha dessas histórias, cada característica dos que estão a nossa volta e fazer de tudo isso uma grande Reinação.

Monteiro Lobato, de José Renato a José Bento, foi mais que um pré-modernista. Antecedendo os acontecimentos que hoje movem o mundo como a procura incessante pelo petróleo ou a chegada ao poder de um presidente negro ele revela-se contemporâneo de todas as épocas.

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