Laboratório vivo

sábado, 6 de fevereiro de 2010

por Fernando Fonseca e Josy Antunes

Fevereiro de 2010. É neste mês carnavalesco que Laboratório Cultural completa seu primeiro ano de vida, mas o trabalho realizado por essa ONG faz com que todos pensem que ela é uma veterana. Só em Nova Iguaçu o grupo reúne cerca de 40 membros – isto é, sem contar com colaboradores de fora da cidade, que surgiram ao longo da trajetória –, provenientes dos editais dos Pontos de Cultura, dos quais participaram como pessoas físicas. “O Laboratório foi a união de jovens da cidade que pensavam a cultura”, explica Daiane Brasil, 23 anos, uma das raízes do grupo, enquanto ainda eram mediadores culturais do programa Bairro-Escola.

Juntos, já haviam formulado muitos projetos e os planos para formar uma instituição já permeava as ideias. “A gente tinha a possibilidade de se juntar a uma ONG ou criar a nossa. Aí veio a necessidade do CNPJ, que é o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, um número de identificação perante a Receita Federal Brasileira, permitindo uma série de ações pertinentes à instituições, como contratos e enquadramentos em editais.”

E então surgiram as dúvidas, comuns às ideias novas: Aonde será? Como será? Que pessoas representariam o grupo? No entanto, a resposta ao primeiro questionamento veio da seguinte forma: Por que o Laboratório Cultural não pode se juntar ao Na Encolha?, perguntaram-se seus articuladores. O questionamento foi um desdobramento natural do “Reza pra não chover”, uma atividade que promovia poesias e intervenções artísticas, reunindo artistas da cidade, a partir do qual já havia sido estabelecida uma relação com Nike, fundador do espaço.

O LC está presente em dez bairros de Nova Iguaçu. A começar pelo Califórnia, onde 350 alunos são atendidos semanalmente, nas oficinas de teatro, graffiti e percussão realizadas através do projeto “Arrastão cultural”. No período das férias, todas elas têm acontecido dentro do Na Encolha, mas logo será retomada a apropriação de espaço dos parceiros: uma igreja católica, a igreja Vida Plena e a associação de moradores. A proposta é representar no bairro o conceito de cidade educadora, não se limitando à sede da ONG. “É o conceito do Bairro-Escola totalmente. Vamos fazer um bairro modelo na Califórnia”, garante Daiane. Modelo este que tende a ser reproduzido nos demais bairros.

Ligações

A maior parte dos alunos são provenientes da Escola Municipal Professora Venina Corrêa Torres, outros são da própria comunidade ou alunos da Escola Municipal Monteiro Lobato, que também são muito bem recebidos, devido ao interesse que demonstram pelas atividades oferecidas. “A escola é extremamente parceira”, elogia a moça, citando os nomes das diretoras do Venina: Célia e Elienai. “Elas se doam completamente pra gente. Elas ligam o tempo inteiro, a gente liga o tempo inteiro pra elas”. A ONG também está marcando sua presença nas oficinas do Mais Educação nas escolas municipais do Califórnia, levando os melhores profissionais para ministrar as oficinas ministradas por intermédio dessa parceria entre o Governo Federal e a Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu. Um bom exemplo é o fato de Negueba, ex-percussionista da banda O Rappa, comandar as aulas de percussão.

Cinco dos dez projetos do Laboratório estão acontecendo desde dezembro, mês posterior ao recebimento dos recursos dos Pontos de Cultura. Além do “Arrastão”, iniciaram-se simultaneamente o “Mural cultural”, o “Laboratório de linguagens livres”, “Descobrindo Nova Iguaçu” e o “Cine celular”. “Não paramos nas férias pra que quando os meninos voltassem às aulas já soubessem o queriam fazer, porque já haviam experimentado. E já temos vários resultados para apresentar”, justifica Daiane, que coordena as oficinas “Linguagens livres” em Miguel Couto. Neste projeto, os alunos produzem textos e histórias em quadrinhos sobre o bairro e, numa lan house, publicam o conteúdo no blogs-fanzines.blogspot, um trabalho admiravelmente delicioso.

Em Tinguá, mais precisamente em Iguaçu Velho – que já foi o centro do município – mora o projeto “Descobrindo Nova Iguaçu”, que pensa o turismo local de base sustentável, inspirado no trabalho realizado na Ação Griot. “Os meninos vão sempre, nunca faltam”, orgulha-se Daiane. “O turismo da cidade é muito fraco e a gente quer um turismo mais cultural”, alega ela, mencionando a Serra do Vulcão, o segundo melhor lugar para saltos e voos do Rio de Janeiro: informação pouco conhecida pelos moradores das proximidades. Tendo como referência a TV Morrinho, há ainda a criação de maquetes de pontos da cidade.

Interferências

O resultado é ainda mais surpreendente quando um projeto de um determinado bairro cruza com outro, como nos momentos em que o jornalzinho on-line produzido pelo “Cine Celular” poderá receber reportagens e imagens feitas pelos meninos de Tinguá. “A gente quer dar um 'start' para os meninos, pra que eles também possam ser os jovens repórteres nos bairros deles”, conta Daiane, que se reúne semanalmente com os demais coordenadores do LC, na sede do Na Encolha. Dessa forma, as “interferências” e ligações entre os Pontinhos estão garantidas. “Todos falam e discutem sobre seus projetos, religiosamente, nas segundas-feiras”.

O “Cine celular” acontece em Três Corações e Austin, onde curtas já estão sendo produzidos pelas ruas dos bairros. Em Jardim Alvorada, “Arte de inovar” trabalhará o reaproveitamento de materiais para a aprendizagem em artes plásticas. “A gente está pensando em transformar todo o material produzido em alguma coisa junto com o bloco de carnaval que tem no bairro”, anuncia Daiane, que está por dentro de todas as atividades do Laboratório.

Em Cabuçu, será trabalhada a literatura aliada à internet, no projeto “Viva leitura”, que fará uso do site Twitter. Espera-se que a inovação atraia a juventude para o interesse pela leitura. Espera-se também que uma biblioteca seja criada, em parceria com o grupo Nós do Morro, que também atua no bairro.

Entre tantos projetos, cabe até a abordagem do Hip Hop, que será aplicado em Jardim Nova Era, no projeto “Ponte”. Dentro dele, serão trabalhados 3 elementos: a dança, através do break; artes visuais, nas aulas de graffiti e o Beat Box, para a qual o oficineiro responsável será Nike. “Estou muito feliz com esse trabalho”, revela ele.

“A maioria dos oficineiros são de Nova Iguaçu. A gente prioriza muito isso da mão de obra”, afirma Daiane Brasil, exemplificando: “Os oficineiros do “Cine Celular” são ex- alunos da Escola Livre de Cinema e a oficineira do “Blogs e fanzines” é ex-jovem repórter”.

Recentemente, o Laboratório Cultural foi contemplado com um edital do ProJovem, tendo como parceiro o Cenarte, em Miguel Couto. Através do edital, será montado um centro de referências em artes plásticas no local. Lá, o teatro será focado por um outro lado, o que está por trás da representação no palco: iluminação e cenário, onde serão pensados como caminhos para o primeiro emprego dos alunos. “A gente pretende também montar um ateliê de cerâmica. O estado do Rio de Janeiro tem poucos”, assegura Daiane.

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