Conversa informal

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

por Jefferson Loyola


Uma conversa informal com Paullo Vieira, diretor de comunicação do grupo 28 de junho. Exatamente no caminho de casa, andando pelas ruas de Nova Iguaçu, caminhamos e batemos um papo informal em relação à sua vida e a escolha dos filmes que foram exibidos nesta semana da diversidade, dias 31/08 e 02/09. Para quem não se lembra os filmes exibidos foram: “Garota Interrompida”, “Uma família bem diferente”, “Todas as cores do amor”, “Transamérica”, “Confidencial”, “Projeto lamarie”, “Matadores de vampiras lésbicas”, “A nada maravilhosa vida social de Ethan Green”, “Fosse o mundo meu” e “Eclipse de uma paixão”.

Paulinho começou a trabalhar como coreógrafo em um grupo de dança, um grupo de colégio. Devido a este seu primeiro trabalho, começou a trabalhar em projetos culturais. Logo após, com 23 anos, começou a fazer teatro e trabalhar como ator. “Como tava difícil a carreira como ator, pensei em largar, e na semana que eu tive este pensamento, fui chamado para trabalhar no Espaço de Cultura Sylvio Monteiro, como técnico”, disse. Mesmo o trabalho não sendo nada parecido com atuação em teatro ou bailarino, ele se dedicou ao trabalho e está no Sylvio Monteiro, um de seus trabalhos atuais, há cinco anos. “No decorrer da vida, nós trabalhamos com tudo, inclusive sendo no teatro. Então além de técnico, eu sei desenhar figurino, montar cenário, criar cenário, dirigir espetáculo, além de atuar, sonoplastia, e muito mais”, afirmou ele, dizendo que se o artista não aprende a fazer tudo, ele morre de fome.

Paulinho também é o diretor de comunicação e produção do grupo 28 de junho, e foi a partir dele, que está sendo feita a semana da diversidade. Assim que ele começou a fazer sua coleção de filmes, fez uma proposta ao Eugênio, integrante do grupo 28 de junho, para fazer uma exibição de filmes em uma das reuniões do grupo. "A primeira amostra de filme foi feita e conseguimos colocar bastante gente para a exibição, eles queriam fazer outra, e neste período da segunda amostra, eles me fizeram o convite para participar do grupo 28 de junho”, explicou. Porém quando ele recebeu o convite, ele estava em Minas Gerais, como técnico de luz de um espetáculo LGBT. “Voltei de Minas Gerais em junho do ano passado, em dúvida enrolei eles por mais um mês, mas em agosto eles me cercaram e eu acabei entrando”, contou, estando dentro do grupo há um ano.

Para quem conhece o “cinebar”, ele também é uma criação de Paulinho, e na verdade uma adaptação. “Na minha cabeça, o cinebar deveria ser uma coisa meio “La Cueva” em Copacabana”, explicou. O seu desejo é que o cinebar seja um barzinho à meia luz, e que quando as pessoas chegassem, tivesse uma luminária em cima de cada mesa. As pessoas beberiam, e em determinado momento, tudo parava e começaria a exibição do filme. Após, continuaria a conversa entre amigos no bar e a beberem, tudo com uma musica rolando e para animar quem gosta de dançar. “Ainda pretendo implantar o cinebar mais a frente como uma coisa mais contínua”. A ultima exibição do cinebar foi em maio, no espaço na encolha, e comemorava o aniversário de 18 anos do grupo 28 de junho.

Sessão de filme ao invés de boate

Paulinho é cinéfilo de carteirinha, tem 536 DVDs na sua casa, dentre eles, séries, filmes e desenhos, pois afirma ser fã de X-men e ter todas as temporadas já feitas. “Baixei um programa no computador para poder catalogar todos meus DVDs e me organizar”, brincou, tendo todos seus filmes numerados e catalogados, sendo que no catálogo, já inclui sinopse, fotos, e mais coisas. “Isso ajuda muito na hora de organizar minha vida”. Sua mãe o considera cinéfilo desde seus sete anos, pois sempre dizia que ele não saía de frente da televisão, porém confessa que foi, mais ou menos, aos 12 anos que começou a assistir filmes sem parar. Desde “O vento levou” até “Bem-Hur”. “Filmes grandes assim, assistia de uma vez só, ficando horas na frente da televisão”, afirmou ele, que já fez uma maratona de 12 horas assistindo filme sem parar, acabava um, colocava outro. “Prefiro uma sessão de filme ao invés de uma boate”.

Paulinho tem uma meta de ter todos os filmes de temática LGBT que conseguir se não ter todos. “Acho que às vezes, devido a isso, vou baixando películas indiscriminadamente, só que acabo baixando coincidentemente o mesmo tema”. Temas como romance, homens complicados, não me dou bem com ninguém, quero adotar um filho, e sou heterossexual e estou saindo do armário, são os mais baixados por ele. A maioria de seus filmes são baixados, apenas alguns são comprados. “Baixo os filmes devido não encontrá-los facilmente em qualquer lugar, por isso a internet é minha grande aliada para conseguir todos os filmes que quero”.

Todos os filmes que ele baixa ou compra, mostram um pouco de sua vivência, inclusive os que foram escolhidos para a semana da diversidade. “Quando vejo, percebo que é engraçado ter passado por aquilo, que doeu e consegui sobreviver”, revelou. Com tantos filmes assim, seria correto afirmar que ele teria duvidas em escolher apenas dez filmes para serem exibidos na semana da diversidade. “Sempre fico em dúvida, mas para sair desta encruzilhada na semana da diversidade optei pelo critério de trabalhar só com atores famosos”, explicou, com o desejo de exibir todos, se pudesse.

Pouco acessível
“O filme garota interrompida, o primeiro que foi exibido no dia 31 de agosto, já assisti a quase 15 anos atrás, às seis horas da manha, em uma sessão do SBT ou globo, não me recordo bem”, revelou ele, afirmando que o que fez ele querer exibir o filme na semana da diversidade, era meio que um protesto em relação aos canais de TV aberta, além de adorar Angelina Jolie e, principalmente, Winoma Ryder. “O que mais me revolta é que se o filme não é engraçadinho e se não for comercial, ele não passa em outros horários”.

“Ninguém merece ficar até três horas da manha acordado para poder assistir um filme, ou então ter que procurar uma locadora específica no centro do Rio de Janeiro, pois não acha em qualquer uma, ou ter que comprar”. Essa é a história de Paulinho com o filme “Garota interrompida”, que o fez querer criar sessões para poder levar a sociedade civil os filmes que não são de fácil acesso. “Penso nas pessoas que não tem internet boa, ou sem acesso ao computador, em como elas fazem para ver esses filmes que são pouco acessíveis e de ótima qualidade?”.

Um dos poucos filmes que não têm uma grande história para ser contada em relação à vida de Paulinho é o “Uma família bem diferente”. Ele ganhou de presente quando já estava trabalhando no grupo 28 de junho. “Eu já havia assistido filme na TV por assinatura e estava debatendo com o Leandro, diretor de finanças do grupo. Vendo nossa conversa à diretoria ficou interessada em assistir o filme”, contou, sendo que devido ao interesse da diretoria, Leandro, comprou o filme, fez a copia e deu para todos do grupo, inclusive ao Paulinho.

Utilizando a semiótica

O próximo filme entra na qualificação do indiscriminado, em relação a buscar e não achar em qualquer lugar. “Todas as cores do amor”, para ele é um fato inédito, pois ele conseguiu o filme, que foi visto por poucos, em uma locadora no Moquetá, Nova Iguaçu. “Começamos a ver o filme e todos que estavam assistindo comigo adoraram, principalmente por que parte da trilha sonora é Tom Jobim”, disse orgulhoso. “Isso é um motivo de orgulho para o Brasileiro. Um filme Irlandês com música brasileira em sua trilha sonora”. Quando ele foi tentar copiar o DVD da locadora, ele pulava algumas cenas, devido estar arranhado. Por isso acabou comprando o DVD do filme em um site, pois queria a versão de locadora.

O que ele mais gosta neste filme é a questão da fotografia, fazendo que você se interesse tanto e nem pisque em nenhum momento do filme. “Até as imagens que você pensa em não estar ligado ao filme, que são as imagens de transição, tem relação com o que aconteceu ou o que irá acontecer”. Um exemplo disso é que quando os personagens começam a se dar bem, começa a aparecer símbolos duplos, como as duas torres, os dois navios se encontrando, porém quando tudo está turbulento, mostra uma tempestade, mostra a chuva. O nome utilizado dentro do cinema para esta técnica de filmagem é semiótica, onde utiliza algumas imagens para poder explicar algo que está explicito. “Para mim o melhor detalhe de todos, é quando no inicio do espetáculo, o personagem Red, está cantando ao chuveiro “não, não, não, não, não”, e tem duas escovas de dente uma de costa para outra. E quando encontra o cara que irá ficar com ele, já começa a cantar uma musica animada, as escovas de dente estão entrelaçadas, como se tivessem se beijando”.

O filme bagunça todas as roupas inicialmente, jogando tudo para o ar. Após, ele pega uma a uma e vai arrumando, deixando os outros perceberem que as combinações iniciais podem funcionar melhor com outras peças de roupas que estão no guarda-roupa. “O filme é muito psicológico e têm uma base Froidiana, por que Froid dizia que o ser humano nasce potencialmente bissexual. Durante a vida ele vai escolhendo qual a sua sexualidade, se vai ser gay, hetero ou bissexual. Uma escolha pessoal de cada um”.

Insatisfação com o corpo

“Não é um filme que tenha muito haver com a minha vida, pois não tenho vontade de ser travesti e muito menos transexual, porém tem gente que passa por isso”, disse, em prol do filme “Transamérica”. Paulinho resolveu assistir a este filme devido ele ter ganhado prêmios, as indicações, inclusive ao Oscar. Às vezes ficamos tão visados em nosso umbigo que esquecemos que temos outras pessoas que passam por isso e é uma história interessante. “Quando assisti fiquei pensando em como é uma mudança de corpo, em ver a insatisfação em ser homem e querer ser uma mulher”.

Paulinho é um dos muitos que quando assistiu a este filme, também achou que a atriz principal é realmente uma travesti. “Quando vi o nome achei interessante ter colocado mesmo uma travesti para poder fazer o papel principal, para mim Felicity é nome de travesti, tanto que na cena que a atriz urina em pé, eu realmente pensei que fosse uma travesti”, brincou. Paulinho queria traduzir uma carta para atriz e foi procurar sobre a Felicity na intenet, nesta procura descobriu que ela era mulher e trabalhava na série desperate housewives.

O mais intrigante no filme é em como a atriz consegue interpretar tão bem o desejo de um homem em ser mulher, e passar tanta confiança e determinação, que realmente convence qualquer um. “Com esse filme, comecei a pensar que os atores de Hollywood deveriam perder o medo e fazer mais filmes com temática LGBT, não que tenha que ser uma imposição e muito menos de que precisa de mais filmes, mas por ser uma realidade que não é a deles, por isso admiro Felicity”, afirmou, revelando seu respeito por Colin Farrell após ele ter feito “Minha casa no fim do mundo”.

Sem máscara do cinema

“São filmes como o transamérica que você vê que não existe máscara nos cinemas e tudo se parece real”, afirmou. O mais intrigante neste filme é que ele termina sem um final específico, no momento, a história dela de ser transexual e operar acabou, porém ela gosta do lado materno ao final, e com a volta de seu filho o fim pode gerar uma segunda parte, contando a história dali para frente. “Acho que perderá um pouco a graça, devido não ter mais o peso da transsexualidade em si, porém acho ainda válido dependendo de quem dirigira o filme”.

“Confidencial” foi o ultimo filme exibido no dia 31 de agosto. “Tem gente que é burra”, afirma Paulinho, devido ter achado o filme em uma locadora de condomínio – o que para ele é inacreditável – largado, esquecido no canto. “Mas o que acontece, temos um elenco monstruoso: Sandra Bulock, Daniel Craig, Gwyneth Paltrow, e muitos outros atores de peso. Que fizeram escada para um ator desconhecido em Hollywood, Toby Jones”, afirmou. Toby Jones, já fez muitas participações e filmes, simplesmente por não ter o tipo físico de Hollywood, mas conseguiu no filme o personagem principal, por ser o tipo físico de Truman Capote. “Quando aluguei este filme, copiei na hora. Agora, meu amor, faz parte da minha coleção pessoal”, brincou.

Filme que toca

A história meio que se confunde, não é uma história, é mais uma pesquisa. Assim é o filme “Projeto lamarie”. A história é um fato real que fala sobre um rapaz, homossexual e assumido, que vai até um bar e dois homens o chamam para sair. Esses dois homens o espancaram, praticamente até a morte, e no meio de tanta brutalidade prenderam ele em uma cerca, onde ficou preso de madrugada até a manha. Ele é achado por um motorista que o leva para o hospital e entra em coma imediatamente, porém falece no segundo dia de coma. O filme relata esta história, porém a partir de um grupo de Novaiorquinos, que está fazendo uma pesquisa do acontecido para produzir uma peça de teatro.

“Vou ser muito sincero, chorei muito quando vi esse filme. O que mais me intriga é o filme deixar no ar se ele foi com os homens por vontade própria ou se foi forçado” contou, revelando a existência de um movimento de atores em Hollywood que fazem filmes independentes e de arte, e feliz por ter gente que ainda se importa. “Eles podem não pegar uma bandeira e ir para a rua militar, bater panela, mas fazem um filme que toca alguém”.

Comédia despretensiosa

“Logo assim que cheguei no grupo 28 de junho, tinha um menino que era meio exagerado e quando o filme estava para ser lançado, ele disse que teríamos que protestar”, disse, em relação ao filme “Matadores de vampiras lésbicas”. Após ter explicado ao rapaz que o titulo poderia ser somente provocativo, e poderia falar sobre o preconceito de um cara que mata vampiras lésbicas, e a partir disso tratar a questão do preconceito, Paulinho ficou esperando o lançamento do filme. “Quando consegui baixar, vi que não tinha nada demais no filme e era apenas uma comédia despretensiosa quanto a qualquer tipo de sexualidade”, afirma.

“Resolvi passar o filme para poder debater o assunto, com as lébiscas, dele ser ou não homofóbico”. O filme brinca muito com o simbolismo, além de colocar as vampiras como lésbicas, aliás, sempre teve uma desconfiança que todo vampiro era gay. “Não sou lésbica e não sei até onde o preconceito contra elas dói, até onde elas se sentem mexidas. Por isso resolvi passar o filme, para que elas possam ver e me falar o que sentiram. As maiorias das que já assistiram ao filme acharam muito engraçado e não virão nada de preconceituoso”.

Sua vida nas telas do cinema

O filme que fala a vida de Paulinho, de acordo com ele, é o filme “A nada maravilhosa vida social de Ethan Green”. “Quem quiser me namorar, assista a este filme, pois entenderá como eu sou”, brincou, dizendo ser complicado igual ao personagem. “Quando o assisti ria tanto, por causa de tanta semelhança que o meu comportamento tem com o do personagem, antes de começar um relacionamento já digo que não irá dar certo”.

Outro filme que de acordo com Paulinho fala um pouco sobre o momento que passa agora, mas que não foi exibido na semana da diversidade é a película “Shelter”. “Já assisti 53 vezes e ainda choro quando vejo”, disse ele. “Baixei no período em que minha irmã caçula ia ser mãe, e o filme retrata a história de um tio que é muito carinhoso com o sobrinho, e ajuda a irmã, sendo que minha irmã é mãe solteira”. No filme o rapaz, encontra o homem que fica com ele pela vida inteira quando o sobrinho completa cinco anos. “Fico pensando onde está o meu príncipe encantado, será que terei que esperar minha sobrinha fazer cinco? Ela só tem um ano e seis meses”, brincou, ironizando que quando chegar já estará com 35 anos.

A história do filme “Fosse o mundo meu (Were the world mine)” é que quando ele saiu no carnaval, de Elfo junto com amigos, e outros de fada. Ele fez a maquiagem idêntica ao que o personagem Timothy, interpretando na peça o Puck, utiliza no filme. “Lógico que não foi tão bem feita, pois não sou nenhum maquiador de Hollywood, mas o círculo, os traços, eram iguais”, afirma. Além de ele ser apaixonado por shakespeare, e o filme ser um musical gay baseado em “sonhos de uma noite de verão”. “Como ator não tenho como não gostar de shakespeare”.

O ultimo filme exibido na semana da diversidade foi “Eclipse de uma paixão”. “Este eu baixei por curiosidade, devido a várias fotos de Leonardo DiCaprio terem vazado na internet e os comentários dele ter feito um filme gay, na época do Titanic”. Um filme singelo e que e com uma história maravilhosa. “Se os alardes que teve na época foram feitos para promover o filme, fizeram muito mal, pois o filme em si é ótimo”. 

Sentimento de realização

Paulinho se sente realizado com a exibição dos filmes na semana da diversidade e também em relação ao trabalho dele no Sylvio Monteiro. “Ser técnico de luz é uma coisa maravilhosa, apesar de muitos não reconhecerem seu valor; Você da a vida ao espetáculo e isso para mim é como se eu tivesse tendo um filho, uma sensação de realização”, afirma. Cada filme tem uma única história, mas para cada pessoa o filme reflete de maneira diferente. Para o Paulinho, eles refletem dessa maneira na vida dele.

1 Comentários:

Yasmin Thayná disse...

Parabenizo este rapaz, apesar de não ter tido muitas pessoas no evento. E eu acho que é assim que deve continuar: com essas iniciativas. Porque essa foi a primeira semana, mas ano que vem com certeza vai ter a segunda e será sucesso garantido. Felicidades!

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