Entre os muros da escola

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

por Hosana Souza


“Nós estávamos cansados de só obedecer queríamos fazer algo por conta própria que nós desejássemos realmente”, diz a estudante Ana Claudia Robould, 16 anos. Um desejo adolescente que tinha mil motivos para se tornar uma rebelião contra as formas de poder do Colégio Estadual Arruda Negreiros se transformou no maior projeto já produzido na instituição escolar.


“A escola têm os mesmos projetos culturais a uns mil anos: é o coral e o grupo de dança. Eles são mantidos ano após ano pelas alunas do Curso Normal, que não o faziam por prazer e sim pela obrigação quanto à carga horária”, explica, a também aluna, Esther Cavalcante, 17. “Ninguém tinha a liberdade de fazer aquilo que gostava, ou simplesmente fazer aquilo que era solicitado mais da maneira que desejasse, nós éramos obrigados a só obedecer as maluquices daquela criatura ignorante”, completa, fazendo referência a animadora cultural da escola.

Dado o cenário e os inúmeros conflitos, ainda com a obrigação de cumprir a carga horária do estágio as alunas do primeiro e segundo ano se reuniram e se uniram para formar um grupo em que elas pudessem mostrar seus talentos e ainda mais, pudessem desenvolver seus trabalhos à sua maneira. “Eu acredito que a parte mais legal em tudo isso é a união que escola têm a partir de então, não brigamos mais nem competimos, aprendemos o quanto cada um é importante”, conta Esther.


 Mas para tudo isso era necessário, além da união e dos sonhos das meninas, um apoio da instituição, afinal, elas estariam criando um grupo secundário. Nessa bagunça organizada elas encontraram uma fiel escudeira, a professora de sociologia Isabel Rocha, ou simplesmente a Bebel. “De primeira nós simplesmente colocamos o nome dela e nem avisamos nada”, conta Ana Claudia, entre risos, “Graça a Deus ela não ficou com raiva e ainda nos apoio”, completa abraçando a professora.

Emocionada Bebel divide seus sonhos de professora e amiga, “Eu sempre quis ver meus alunos unidos, felizes, conscientes de seus talentos. Tinha certeza de todos esses talentos; sabia que tinham voz, ritmo, comprometimento, força de vontade”, diz a professora, que completa: “Eu tive um sonho, o de ver turmas, turnos e hierarquias se desfazendo em risos, em admiração, em encantamento. Porque fazia parte do meu sonho a união de iguais, que somos todos nós que compartilhamos esse espaço que se chama Arruda Negreiros. E que hoje abre espaço para um novo momento que se traduz em uma conquista”.

As conquistas comentadas pela professora são o reconhecimento do projeto Voz e Movimento, O grupo iniciou sua série de apresentações na ONG Onda Verde em Tíngua, no Dia da Árvore. Depois do test-drive se apresentaram no Instituto de Educação Rangel Pestana onde venceram o campeonato municipal e seguiram para a quadra da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis e se transformaram nos campeões do Concurso Estadual de Música das Escolas Públicas, no último dia 17 de novembro.. Daí por diante foram seguidas mostras, na Escola Municipal José de Anchieta, no Cacuia, na Escola Municipal Ivonete dos Santos Alves, em Rosa dos Ventos e no CIEP 394, também em Rosa dos Ventos.

“Nesse CIEP foi o mais engraçado”, relembra Natan Fernandes, 16, “Nós fomos convidados para a apresentação no Ivonete, nós não tínhamos transporte e fomos – cada um com suas latas e roupas – de ônibus comum e sem direito a gratuidade. Nos apresentamos e almoçamos com as crianças, nisso, quando já estávamos voltando para a escola, à diretora desse CIEP que é vizinho ao Ivonete nos viu brincando e cismou que teríamos que apresentar o projeto para os alunos de lá”, conta sorrindo. Os meninos, que tem prazer em se apresentar, não negaram o pedido e marcharam rumo ao CIEP. “No final conseguimos até lanche, fora o convite pra ministrar uma oficina lá e reproduzir isso tudo. Cada dia tem sido melhor”, encerra Natan.

O projeto que teve inicio em agosto desse ano com tímidos ensaios e em três meses o sonho contagiou não apenas as outras turmas do Curso Normal, mas também os alunos do Ensino Fundamental e da Formação Geral, nos turnos da manhã e da tarde, e o grupo que ensaiava com 10 latas de tinta - por pura falta de verba - se transformaram em 80 jovens divididos entre um grupo de percussão, um grupo de dança e um coral, além de um grupo de apoio. “Conquistar é um dom, um desejo, uma consagração, alcançar o prêmio resultado de um esforço. Conquistar é saber que se é tanto ou até mais do que se julgava ser, ir além de seus próprios medos”, encerra orgulhosa a professora Isabel.






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