Fogo no templo

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

por Felipe Branco


Ouvir jazz e heavy metal, tocar rock e hip-hop, dançar, produzir eventos, estudar e fazer roteiros e filmes, ir a estádios de futebol são só uma pequena mostra do que os novos crentes estão fazendo. Crentes nunca foram de ouvir jazz, heavy metal ou hip-hop, por serem recriminados ou simplesmente por essas coisas terem muita afinidade com o meio cristão tradicional. Fazer filme é coisa de gente moderninha ou descolada, coisa que crente não é, ou não era. Estádio é ambiente pesado, lugar que o crente não deve frequentar, ou não deveria se continuassem pensando como antes. Quem enxergava os evangélicos como seres de outro mundo, seres isolados da sociedade, presos no seu próprio mundo, livre dos prazeres e dos hábitos que a sociedade oferece, se engana. Hoje os crentes são uma parcela significativa da população, cerca de 46 milhões e atravessam todas as classe sociais. Há quem estime que em 2020 metade dos brasileiros será de crentes, já que seu crescimento é bem maior do que o crescimento da população total.

Rafael Schubert, um morador de Queimados de 19 anos e membro da Igreja Nova Aliança, não vê incompatibilidade entre sua opção religiosa e o hardcore que toca na banda Status Condicional, cujas letras louvam Deus da maneira tradicionalmente ácida desse estilo musical. “Nossas letras falam das pessoas que negam a existência de Deus, mas quando precisam de algo dizem 'ai meu Deus', conta o roqueiro, que também usa sua arte para criticar as pessoas que, embora acreditem no poder de Deus, continuam errando.


Além do rock evangélico, Rafael se interessa por cinema, uma arte que estuda por conta própria com o interesse de se tornar o roteirista e diretor de filmes comuns, sem bater na tecla da favela. “Não gostaria de ser ‘super famoso’. Só quero fazer algo diferente no ramo", conta ele, que já escreveu algumas historias evangélicas "um tanto controversas e subversivas pro mundo".

O futuro cineasta, que tem ojeriza do "politicamente correto", evita os personagens que vão seguir um herói num mundo contemporâneo. "Acho que as pessoas pensam melhor quando a coisa é mais próxima de suas próprias realidades, e sozinhas tiram suas próprias conclusões”. Além de evitar lições de moral, Rafael sonha com um cinema mais tapa na cara e longe da mansidão habitual que predomina as antigas produções evangélicas.

A produção cinematográfica com a temática cristã sempre existiu, mas recentemente ganhou fôlego com produção em maior quantidade e principalmente em qualidade. São curtas-metragens que surgem a toda hora, não só no Brasil mas também no resto do mundo, geralmente sobre as igrejas e grupos de estudo do Evangelho. Filmes maiores já conseguem ter uma visibilidade maior e um até circulação comercial, além dos filmes hollywoodianos que abordam a temática cristã mais discretamente, como foram os casos de "As Crônicas de Nárnia" ou "O Livro de Eli".

Chico Buarque
Jéssica das Virgens, uma moradora de Nilópolis de 20 anos, exemplifica bem o modelo de evangélicos que trabalham no mundo, e até para o mundo, mas sem desrespeitar sua fé. “Deus é a minha vida, fui criada dentro do ensinamento cristão, ou seja, pra onde eu for ou o que fizer eu sempre terei isso comigo, mesmo atuante ou não dentro da igreja, foi o que eu aprendi, foi com o que eu cresci, é como andar de bicicleta, ou aprender a somar”, diz ela, que está no último período de produção cultural. Embora sua atuação não seja diretamente relacionada ao meio evangélico, ela ressalva: “Não vou organizar um evento gay na praia de Copacabana, isso vai contra minha índole e contra meus preceitos. Obviamente vou respeitá-los, assim como faço, porque são humanos, são pessoas como todos, mas isso não quer dizer que eu aprovo e vou trabalhar pra eles. Agora, se sou convidada para montar o show do Chico Buarque, com certeza estarei lá organizando... Se o show dele não envolve nada que venha me desrespeitar ou aquilo que prego e acredito, por que não trabalhar?”

Jéssica, que é da Igreja Batista Central de Queimados, acredita que o mundo precisa de mais Deus e menos religião, da verdade dita e não imposta, de ajuda e não de julgamento. “Ser ‘abitolado’ com religião não te faz santo, te faz um julgador, achando que é santo e dono da verdade. O mundo não é puro, mas não é por causa disso que vamos nos trancar dentro de casas e igrejas e viver disso. Precisamos estudar, trabalhar, ter amigos, viver nossa vida nesse mundo, mas sabendo usar, aproveitar e diferenciar as coisas”.


O que difere esses novos caminhos que os jovens cristãos estão trilhando é a sua postura em relação ao mundo. Embora trabalhem com coisas do mundo, não se comportam como se fossem do mesmo. Tudo que é feito por eles é feito para o Senhor ou conforme ensina a Bíblia. Um exemplo disso é uma torcida organizada do Botafogo, a Fogospel. Torcidas organizadas são conhecidas por disseminar ódio e violência contra outros torcedores, consumir álcool antes, durante e depois das partidas e de xingar. A torcida Fogospel, que começou em 2007 através de uma comunidade no Orkut, hoje agrega evangélicos que torcem pelo Botafogo e que entendem que a vida cristã não se resume às paredes da igreja. O fundador da torcida, Hércules Spínola Martins, de 40 anos, é pastor presidente da Comunidade Evangélica Torre Forte em Olaria, explica a idéia: “Uni minha paixão por Jesus e pelo Botafogo num caminho que gerasse comunhão entre os muitos que têm essas paixões em comum e também como uma maneira estratégica para pregar o evangelho, e ser um canal de promoção da paz nos estádios, em oposição a toda violência.”

O objetivo da Fogospel é ganhar espaço e demonstrar mais uma vez que o povo de Deus não está fechado nas quatro paredes da igreja, alienado do mundo. "Somos normais, torcemos com paixão, compramos camisas, ajudamos o clube, mas mantemos nossa fé e nossa missão, indo por todo mundo e pregando o Evangelho a toda pessoa.”

1 Comentários:

Algumas informações estão equivocadas. Há 10 anos o grupo Oficina G3 toca Rock gospel. Há seis anos atrás, fui na minha 1ª marcha pra Jesus, onde milhares de pessoas foram seguindo os trios elétricos no Centro do Rio, tocavam hip-hop, Axé, pagode, tudo gospel. Há 15 anos, alguns jogadores de futebol e pagodeiros formaram um grupo gospel de pagode. Se vc for na minha igreja, O Ministério Apascentar de Nova Iguaçu, não tem como não dançar, é mt animada, pra cima, pulo mais q no show da Beyoncé. Antes o que pode ser q houvesse, era uma recriminação com os evangélicos. Sou cristã, Cineasta, atriz, cantora, em breve Jornalista e Publicitária. Sou evangélica, creio e amo muito o meu Deus, mas, isso não me impede, nem a outros CRENTES como vc disse, q eu seja quem sou. Afinal, a biblia diz que é realmente feliz. Neemias, 8. 10 diz: "Disse-lhes mais: Ide, comei as gorduras, e bebei as doçuras, e enviai porções aos que não têm nada preparado para si; porque este dia é consagrado ao nosso Senhor. Portanto não vos entristeçais, pois a alegria do Senhor é a vossa força".

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