Escola modelo

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

por Lucas Lima

Em seus quatro anos de existência, a Escola Livre de Cinema, situada no bairro de Miguel Couto, em Nova Iguaçu, não formou apenas alunos capacitados para fazer audiovisual, mas também uma nova forma de as pessoas verem o mundo e terem uma nova percepção de território e centralidade. Além disso, o projeto deu uma alta visibilidade para o município.

Segundo Anderson Barnabé, coordenador artístico, Nova Iguaçu só atraía a atenção da mídia pelo sua miséria e pela sua pobreza. "Quando começa a surgir pessoas fazendo audiovisual, esse audiovisual interagindo e dando espaço a outras linguagens, começamos a ter muita visibilidade. Hoje temos que marcar hora com cineastas e pessoas que desenvolvem projetos sociais até de outros países. As pessoas passam por aqui para saber como existe uma escola de cinema na periferia da Baixada que produz além de cinema em si, pensamentos".



Porém, mesmo com toda essa visibilidade direta e positiva para a cidade, a equipe da ELC terminou o ano de 2010 com uma enorme preocupação. "Fechamos dezembro bem preocupados com os rumos que a escola poderia tomar, já que não estávamos vendo muita possibilidade de mantê-la aberta, em função da descontinuidade do patrocínio que a Prefeitura mantinha com a gente desde 2006. Poderíamos ter acabado com o horário integral, com o curso regular, com o Iguacine e todas as nossas ações. Fizemos até uma reunião com os pais, onde colocamos a hipótese de a escola fechar, ou de reduzir o número de pessoas atendidas".

Para Anderson Barnabé, não existe uma escola como essa em nenhum lugar, e por isso mesmo a ong Reperiferia, que toca a ELC, sonha em multiplicá-la para todo o Brasil. "Hoje entendemos que não somos um patrimônio mais de Nova Iguaçu nem da Baixada. Ela é de todo o Brasil, é nosso, é de todo mundo", conta. "Por um acaso a escola está aqui e naquele momento a Prefeitura era a patrocinadora, mas a escola não só existe por conta da Prefeitura e não só existe porque está em Nova Iguaçu".


Ele diz ainda que fechar não é somente interromper as atividades. "Somos hoje seis pessoas que dirigem a instituição, e não sabemos dizer em que momento estamos trabalhando e em que momento estamos vivendo. A vida de todos nós já está muito misturada com a vida da escola. Logo, a possibilidade de fechar não era só interromper a nossa vida, mas sim a vida de outras pessoas que poderiam passar por aqui, como as 4 mil que passaram nesses quatro anos".

Recomeço
"Quando sentamos para conversar com a Prefeitura, uma das questões que colocamos foi exatamente a da visibilidade. Acabar com a escola era não só perder um parceiro ou só deixar de atender as crianças, mas sim deixar de dar uma atenção que era muito difícil de chegar". Com todo esse olhar que a escola já recebeu, a enorme qualidade e quantidade de material que a escola possuía, a equipe foi bater à porta de quem realmente pudesse ajudar a segurar a enorme onda de compromisso e responsabilidade que é manter a instituição.


"Juntamos todo esse material e fomos atrás de quem pudesse nos dar total apoio, porque não é fácil. Fizemos uma tabela de custos, gastos e outra de atividades, sentamos e vimos quais as possibilidades. Uma grande realidade é que todo mundo que desenvolve cultura hoje no Brasil é através da Petrobrás". Barnabé confessa ainda que a questão do pré-sal foi um fator decisivo. "O destino financeiro será: cultura, educação e saúde. Se todo esse dinheiro, que não é pouco, vai atender parte da cultura por que não correr atrás?"

A ELC firmou uma parceria de três anos com a Petrobrás e tem a partir de 2011 esse mesmo tempo para transformar a escola numa escola modelo. Por conta desse patrocínio, a instituição recebe, no próximo dia 28, a visita de um representante do Ministério da Cultura. "A visibilidade que a Petrobrás dá é muito grande, essa pessoa vem conhecer a escola, a metodologia usada e conversar sobre a possibilidade de multiplicar essa metodologia para outros estados".

Uma das principais metas da equipe da ELC é, segundo Anderson Barnabé, fazer com que essa metodologia seja aplicada nas salas de aula das escolas regulares do ensino público de todo o país. "Acreditamos que trabalhar audiovisual da maneira que a gente trabalha, misturando artes plásticas, teatro, música, literatura, faz com que o estar em sala de aula seja mais instigante e opera na subjetividade das pessoas de uma forma que o aluno sendo passivo em relação ao professor não recebe".

Uma pesquisa feita pela ELC, e acompanhada pelo Itaú Cultural, mostra que as crianças que estudam na instituição têm um desenvolvimento intelectual e social muito maior do que as que não frequentam a mesma, o que se reflete no desempenho escolar através das notas.

Altas mudanças
Agora toda e qualquer criança pode e deve usufruir dos bens da escola. Uma vez que a parceria com a Prefeitura restringia essa relação aos estudantes da rede municipal. Esse é o primeiro, mas não único benefício que esse patrocínio traz.



O número de crianças atendidas aumentou junto com a quantidade de cursos. "Entre as novidades desse ano, estão o curso de dublagem, blognovela, audiovisual para educadores, além de um concurso de videoclipes para o Youtube, esses que serão feitos pelos próprios alunos, com músicas de bandas de todo país. Além disso, temos a 4º edição do Iguacine em novembro". As inscrições estão abertas, e qualquer dúvida pode ser tirada pelo 2886-3889.



Luana Pinheiro considera a abertura de algumas portas o principal benefício. "A Petrobrás não patrocina qualquer projeto e a chancela que ela traz é ótima. Esse patrocínio já trouxe novos ares, novas perspectivas, novos planos. Essas mudanças vão da decoração aos cursos". Para a produtora de 24 anos, a renovação da ELC traz um gás a mais para todos, o que "ajuda para recomeçar os trabalhos", segundo ela. "Quando a escola estava em vias de parar de funcionar foi uma comoção geral. Fiquei triste com essa possibilidade", conclui.

"Diferentemente da Prefeitura, a Petrobrás tem uma proposta de trabalhar com as crianças independentemente de fazer parte de qualquer tipo de projeto, ou seja, qualquer uma pode estudar lá agora, e não só as do Bairro Escola. Os novos patrocínios também dão muita visibilidade e até mesmo credibilidade. Porém, seria bom se a Prefeitura estivesse junto", opina o estudante do curso de animação Daniel Santos.



Daniel julga só ter tido aprendizados positivos dentro da ELC. "A relação de produção foi bastante intensa e coletiva. A maior experiência que eu passei foi a de altruísmo. Estive muito disposto a ajudar meus companheiros com o conhecimento que tinha, ganhei muito com isso".

Junto à renovação da escola, o jovem vê também a sua renovação dentro do ambiente. "Estou fazendo o curso de capacitação para monitores, espero ser selecionado. A escola me mostrou vários caminhos e muito do que eu preciso pra seguir na área de animação. Agora estou trilhando novos caminhos para obter mais qualificação. Tenho vontade de ter meu próprio desenho animado."

1 Comentários:

Julio Ludemir disse...

Caro Lucas,
Esta foi sua melhor matéria em toda a sua história no JR. Parabéns.

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