Eu odeio o Calçadão

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

por Renato Acácio

Os iguaçuanos podem se orgulhar de muitas coisas iguaçuanas, mas certamente não se orgulham do seu Shopping a céu aberto ou da região que se convencionou chamar de Calçadão. Generalizado ou não, os “insanos” que possam vir a amar esse lugar hão de convir que é no mínimo curioso tal Shopping a céu aberto ser chamado de Calçadão. Primeiro que a calçada nesse pedaço do inferno, nos trechos onde elas existem, não é lá grande coisa em extensão. E segundo que o Calçadão nem é uma via para um agradável passeio com uma bela vista, como o nome poderia vir a sugerir. Muito pelo contrário! A avenida Governador Amaral Peixoto e adjacências são uma pequena demonstração, um aperitivo, como dizia, do que veria a ser o inferno, que é de fato consolidado com o final do ano, o natal e o verão carioca vivenciado a uma hora e pouca da praia mais próxima.

Uma coisa é mau humor, outra coisa é etnocentrismo invertido e outra é sociofobia. Mas a realidade inescapável, a verdade verdadeira, é que no fundo todo mundo odeia o Calçadão de Nova Iguaçu puramente pelo que ele é! Afinal como amar andar sob um calor de mil graus centígrados, com um milhão de pessoas ao seu redor que andam a passos de formiga? Não tem sentimento ufanista, no caso provinciano, que resista a esse incômodo. A situação é tão bizarra e caótica a ponto de termos engarrafamento de pessoas. Veja só este pequeno absurdo: Na hora do rush há engarrafamento de pedestres no nosso shopping a céu aberto! Não tem como amar nosso Calçadão sem ser um pouquinho hipócrita ou um romântico masoquista.

Nesse sentido poucos parecem assumir, mas ninguém passa pelo Calçadão de bom grado ou simplesmente para arejar a cabeça, como se poderia fazer na Via Light, ou no climatizado shopping a céu fechado, vulgo Top shopping, por exemplo. Todo mundo que co-habita o Calçadão de Nova Iguaçu está ali dividindo aquele mesmo espaço, naquela mesma hora, por uma questão de pura e estrita necessidade. Nossos concidadãos, numerosos por sinal, estão ali para cumprir tarefas burocráticas, trabalhar, pagar contas, comprar o que está faltando, ir para escola, visitar o dentista, pegar resultados de exames... Enfim, todo e qualquer tipo de atividade o mais afastada do lazer e quiçá do prazer possível. Uma passada rápida de uma ponta a outra da rua e logo o bom e sensível espectador percebe o peso desse caos. As expressões de impaciência, angústia, irritabilidade e principalmente cansaço imperam no ambiente fazendo dele impróprio para pessoas que tenham e possam fazer coisa melhor do que dar “uma rolé no calçadão” ou como diria a vovó “ver as moda”.

É claro que nem todo mundo associa o nosso querido Calçadão a aborrecimento, enfado ou desconforto. Afinal é raro, raríssimo, mas tem gente que gosta de pagar conta e enfrentar uma fila, as vezes. Outras realmente gostam de estudar e muitíssimas até mesmo de trabalhar! O problema é que mesmo suprindo suas necessidades com extremo prazer, a coisa não é tão simples quanto possa parecer. Há de se conviver com, além do calor e da quantidade opressiva de pessoas já mencionadas, com o barulho de tudo. Do trânsito, dos vendedores anunciando promoções relâmpagos, das propagandas auditivas, dos exames de vistas grátis, dos ambulantes vendendo seu “peixe” aos quatro ventos, além das milhares de conversas ao vivo e por telefone que juntas formam um barulhão, fazendo do silêncio algo que estaria para água no deserto do Saara. Artigo de luxo.

Quem tem estômago fraco também não anda no shopping a céu aberto que transpira cheiro de transpiração, de uma parcela que por algum motivo aboliu o desodorante da sua vida, e também de gordura queimada das lanchonetes. Percebe-se também, embora mais frequentemente na parte da noite, a soma desse conjunto ao cheiro de putrefação dos alimentos que foram se estragando sob o sol do dia que passou. Temos então: calor, multidão, barulho, fedor e um outro agravante de duas faces: um para motorista e outra para pedestre. Se você cometer a loucura de tentar andar de carro no Calçadão, corre o risco de ficar muito irritado. Isso porque as pessoas andam muito devagar ou estão cansadas demais para andar rápido, fazendo com que os mais apressados e ansiosos atrapalhem o trânsito do local. É um círculo vicioso, onde todo mundo irrita todo mundo e todo mundo engole a seco, suspira, conta até dez, medita e se controla porque afinal de contas vivemos em uma sociedade que preza pela sanidade, ainda. Muitos vão para rua também para fugir dos terríveis “homens-sanduíches” compradores de ouro e distribuidores de papel ou para evitar ser indelicado com a moça que você tem certeza que vai te parar para oferecer um desconto irrecusável para um curso de computação a pouco menos de 10 minutos do banco fechar.

Basicamente são esses fatores primordiais que fazem do calçadão um lugar que é digno da esquiva, repúdio e até mesmo ódio de boa parcela da população Iguaçuana e que mantém essa curiosa relação afetiva de “mal necessário”. Não nos sintamos culpados em odiar nosso shopping a céu aberto porque o papo não é de “ame ou deixe-o”. Ao contrário, odeie-o e deixe- o mais rápido possível e sem medo de ser feliz, bem longe dele de preferência.

http://www.youtube.com/watch?v=Gux6xoujLfg&feature=related

“Daniela: Não sei se são pessoas demais ou calçadas muito estreitas, ou se é uma fusão desagradável dos dois elementos.” (Edifício Master – Dir. Eduardo Coutinho 2002)

Certamente ela não conheceu o Calçadão de Nova Iguaçu.

2 Comentários:

Amanda Camilo disse...

Até que enfim, verdade seja dita!
Renato, tinha que vir de você!

Shopping a céu aberto?
Ou feira no meio da cidade?

Nem a India chega tão próxima ao tremendo caos encontrado nesse pedaço de tormento chamado Calçadão de Nova Iguaçu !!!
Calçadão de quê ? Vista para o quê ? Só quem precisa passar por lá sabe o que estou falando....
Poeira, gritos, mau cheiro, confusão, calor, desorganização, enfim, lá encontramos tudo que é necessário para se viver mal e muito mal...
Aquilo é caso para a ONU intervir !!!
Boa noite.

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