Eternos professores

quarta-feira, 23 de março de 2011

por Yasmin Thayná

Caixotes de plástico amarelo com livros e dvds infantis, pufes coloridos, tapete verde, estante vermelha, iluminação natural, caixote de madeira, mesas branca e, no fim, uma porta de vidro que dá acesso a uma sala fresquinha com televisão e aparelho reprodutor de vídeos.

O monopólio na biblioteca, dessa vez, não foi dos alunos do Elite, Iguaçuano ou Tamandaré, mas do Primeiro Degrau, que fica no bairro Santa Rita - Baixada Fluminense. Os pequenos deram cor ao espaço mais vazio e, talvez, rico da Biblioteca Municipal Cial Brito: o espaço infantil. A biblioteca, que fica no Espaço Cultural Sylvio Moteiro, no Centro, recebeu na tarde da última sexta-feira trinta e cinco meninos e meninas de segunda à quarta série.

Renato Pereira, 22 anos, técnico de informática, coordenador de projetos pedagógicos e pesquisador da escola, foi o responsável pela visita dos meninos à Cial Brito. Renato é um frequentador do espaço e começou a amadurecer a ideia de levar as crianças para penetrar surdamente no universo das palavras quando soube que lá teria visita guiada. "Queria tirá-los do meio padrão em que vivem: televisão, casa e escola. Existe um mundo muito maior e precioso além dos que eles estão acostumados," afirma ele, que no final do ano passado levou os meninos até a Biblioteca Comunitária Paulo Freire, que fica no mesmo bairro da escola. A visita à Paulo Freire foi recheada de vídeos e contação de histórias.

Filho de professora e cantor, Renato diz que isso não influenciou no interesse em trabalhar com crianças, já que seu desejo é trabalhar com administração. "Eu pesquiso o universo infantil porque quando se têm crianças bem educadas, teremos adultos saudáveis. Entenderemos os adultos estudando as crianças", revela.

Eles chegaram de surpresa na biblioteca, mesmo havendo um processo de comunicação antes entre a escola e o espaço que visitaram. "A visita seria segunda-feira da semana que vem, mas só conseguimos disponibilidade na sexta-feira, o que deixou as bibliotecárias confusas."


A pesquisa que Renato faz é sobre a melhoria de comportamento dos alunos dentro de sala de aula, onde ele acredita que influencia no jeito de se portar na rua e em casa. O interesse dele começou dentro da igreja, onde ele fazia um trabalho voltado para a educação. "A única diferença era que na igreja eu aplicava ensinamentos bíblicos", compara.

Um dos filmes que ele trabalhou dentro da escola foi o "Tá dando onda", que é sobre um pinguim que sai de sua casa para participar de um evento numa ilha e faz novos amigos durante sua aventura. "Para ele, vencer é o que mais importa até conhecer a voz da experiência, que o ensina que o vencedor nem sempre é aquele que chega em primeiro lugar", conta ele, que exatamente por isso o escolheu para trabalhar com a motivação das crianças.

"A educação é capitalista e muito mecânica. Desde pequenos, nos é passado que para se ter dinheiro, é preciso estudar. E isso faz com que eles pensem que estudar é só para ser rico. Eu gostaria que eles pensassem de outra forma e aproveitassem outras ferramentas", protesta.

A grande dificuldade que Renato enfrentou no processo de produção da visita foram os pais. Durante a semana, o rapaz realiza, dentro da escola, reuniões regulares utilizando ferramentas para prender a atenção das crianças. "Às vezes, a mãe não enxerga a necessidade de um menino desses ir à biblioteca e acaba não deixando."

Além do Renato, três professoras de ensino básico fizeram parte da equipe. Rita de Cássia, professora de terceira e quarta séries, não conhecia a biblioteca. Ela começou a trabalhar como professora na escola de seu irmão, quando tinha apenas 12 anos. "Não queria ser professora. Meu irmão abriu a escola e fui trabalhar. Aprendi a lecionar com a minha cunhada e minha irmã", revelou.

Ela é mãe de quatro crianças: dois estudam na mesma escola onde trabalha e uma na Escola Estadual Maria Emília do Amaral Fontoura, que fica no mesmo bairro de Santa Rita. Os filhos não puderam ir por serem muito novos e, para ela, ser professora significa a sua vida. "Um dia desses encontrei com um aluno e ele já tinha vinte e oito anos. Ele lembrou de mim e disse: 'minha eterna professora.' Fiquei muito feliz. Eu me sinto realizada sendo professora e vou ser pelo resto da vida. Eu sei pouco, mas passo da melhor forma para que eles aprendam", finaliza.

Além da leitura, as bibliotecárias convidaram os pequenos para conhecer o espaço que tem tv e aparelho de vídeo. Elas exibiram o filme "Kiriku e a feiticeira", de Michel Ocelot. Minutos após a atenção dos meninos, a diretora da Cial Brito, Malena Xavier, perguntou se podia dar uma pausa. "Boa tarde, meninos. Vamos todos assistir ao filme lá no teatro? Fica mais confortável", disse, pedindo para que as professoras a ajudassem a calçar as crianças e descer as escadas com elas.

Renata Alves é professora de primeira à quarta série. Seu objetivo é atrair os meninos para um mundo mais abrangente, que não deixe traumas, já que as crianças gostam de muitas coisas, porém são poucas que as motivam e formam as suas personalidades. Além disso, ela participa das reuniões com os alunos e já notou diferença. "Elas preferem as reuniões do que as aulas. Mas a gente explica que a aula é tão importante quanto a reunião, mas que elas precisam ouvir para se comportar nas aulas e aprender mais dentro da sala de aula."

Joelma Guimarães é professora da segunda série e também estava presente, mas não pode dar entrevista porque ficou na sala de vídeo assistindo ao filme com os alunos.

2 Comentários:

Julio Ludemir disse...

caríssima
voce encontrou seu texto, seu tom, seu charme. suas reportagens estao cada vez melhores. vida longa no jornalismo. parabens pela sua rapida evolucao.

Hosana Souza disse...

Yasmin brilhante como sempre!

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