Guerra de classes

quarta-feira, 6 de abril de 2011

por Lucas Xavier

Sou morador do bairro de Comendador Soares desde meus dois anos. Nesse bairro tão marcado pela pobreza, cresci com uma condição social muito confortável – mesmo não sendo rico – e convivi com pessoas com uma renda muito abaixo da minha. Com três anos, fui matriculado no IESA (Instituto de Educação Santo Antônio), e lá fiz pessoas que tinham uma condição financeira muito parecida com a minha.

Meus amigos em Comendador Soares são os mesmos de muito tempo. Conversando com um deles, mostrei uma foto onde estávamos eu, meu amigo do IESA (Marcus Vinícius) e sua então namorada; uma menina muito bonita. Ao se surpreender com a beleza da garota, meu amigo de CS falou: “Com certeza ela só o namora porque sabe que ele tem dinheiro.” Aquilo me intrigou. Afinal, sem conhecer Marcus, aquilo seria um pré-conceito.



A mesma coisa acorreu de forma inversa, quando fomos (eu e meu grupo de amigos do IESA) para a casa de Gabriel Vieira, no Bairro da Luz. Lá vimos alguns rapazes, aproximadamente da nossa idade, jogando bola na rua. Nesse momento, um de meus amigos falou para o grupo: “Ainda bem que minha mãe nunca me deixou sair na rua. Já pensou se eu viro um ‘favelado’ desses?”. Aquela frase (muito mais um preconceito do que um pré-conceito) mexeu comigo e me fez refletir. Qual é a intensidade dessa relação de inimizade cultivada por grupos sociais distintos? Por que meus amigos de Comendador não me consideram um playboy, já que eu tenho uma renda um pouco maior? E por que meus amigos do IESA não me consideram um favelado, já que cresci com amigos que recebem essa rotulação?

Perguntei ao Gabriel Vieira o porquê de eu não ser considerado um ‘favelado’. “Ah, você tem mais dinheiro que eles, né”, respondeu-me. E perguntei ao Leonardo, meu amigo de CS, o motivo de eles não me taxarem como playboy. “Você anda com a gente, por isso não é playboy”.

Então, eu me dei conta de que na contramão da diminuição da desigualdade socioeconômica dos últimos anos, vem crescendo um preconceito não menos errôneo: aquele entre classes sociais diferentes. Todos conhecem, mas poucos dão atenção. E é exatamente por essa falta de atenção dispensada a um problema tão grave, que ele tende a piorar.

Se eu soubesse dessa rotulação de playboy, teria medo de me aproximar dos rapazes de Comendador. E se eu soubesse dessa taxação de favelado, também nunca teria me aproximado dos colegas do IESA. E então, de quem eu seria amigo?

O preconceito e a exclusão causados por esses rótulos não causam apenas distanciamento de grupos. Ele causa a discórdia. Como por exemplo, quando fui questionado por meus amigos aqui de Comendador: “Por que ainda anda com esses moleques riquinhos do IESA?” Qual é a resposta para essa pergunta? Será que devo iniciar um sermão, pedindo tolerância e clemência? Provavelmente, eu apenas perderia meu tempo. Então o que fazer? Qual é o remédio para sanar essa herança cultural, o preconceito com quem é diferente?

São em momentos como esses em que vemos que apesar de termos avanços claros, o ser humano é em sua natureza egoísta, mesquinho e intolerante. E a única forma de evitar essa ignorância é o conhecimento. Será que uma campanha séria contra o preconceito entre classes seria a solução? Não sei. Mas com certeza não podemos ficar calados, enquanto o seu grupo social é discriminado por aqueles que não são como você; numa Guerra de Classes nada Marxista.

2 Comentários:

Lucas Xavier Cavalcante disse...

"e lá fiz pessoas que tinham uma condição financeira muito parecida com a minha."
-
Eu estava jogando The Sims. rs

Nicole Meireles disse...

Sou sua fã nº1.
Mais uma vez está de parabéns!

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