por Saulo Martins
"É só um ensaio", disse o Sr. Chow para a Sr.a Chan enquanto ela chorava debruçada em seu ombro com uma trilha sonora com uma música latina de fundo: esse é um dos momentos mais marcantes de Amor à flor da pele (2000), do diretor Wong Kar-Wai. Com uma atmosfera intimista de cores e palavras significativas e com atuações invejáveis, o filme conquista o espectador sem nenhuma cena de beijo, apesar de discursar sobre o amor.
O cinema oriental sofre preconceito de nós ocidentais, isso é notório. Eu mesmo, assumo, relutei muito antes de assistir esta obra. As poucas cópias asiáticas que chegam a nós nos passam as atuações caricatas e a frieza de um povo que parece mecânico. Nunca poderia imaginar que um filme feito na China pudesse criar um ambiente tão propício para o amor como Amor à flor da pele fez.
O roteiro conta a história de dois casais vizinhos: Os Chan e os Chow (o que pode causar muita confusão no início). A Sr. Chan é uma secretária e seu marido é um homem que viaja muito para o Japão. O Sr. Chow é um jornalista e a sua esposa é uma mulher que sempre faz hora extra e quase nunca encontra o marido acordado. A escolha de Wong Kar-Wai de não mostrar o rosto do Sr. Chan e da Sra. Chow é de prima importância para que o espectador se sinta distante deles assim como os seus cônjuges se sentem. A secretária e o jornalista se aproximam como busca pelo conforto da solidão, e acabam achando um no outro um lugar pra chorar quando descobrem que a Sra. Chow e o Sr. Chan estão vivendo um romance.