Rima entre cor e dor

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

por Jefferson Loyola


Conhecido como o poeta do povo, o escritor negro Solano Trindade deixou uma grande marca no Brasil, principalmente na cidade paulista de Embu, onde criou um pólo de cultura e tradições afro-americanas. Foi o primeiro artista brasileiro a misturar militância política com a questão racial, declamando em seus versos a realidade do povo, as mazelas de um país onde os afro-descendentes são as maiores vítimas das grandes diferenças sociais. Filho de Francisco Solano Trindade e Emerência Maria de Jesus Trindade, conhecida como Quituteira Merença, ele nasceu em 24 de Julho de 1908, no bairro de São José, no Recife, Pernambuco. Era poeta, pintor, teatrólogo, ator, escritor e folclorista.


Outra importante marca de sua poesia foi o diálogo com a própria história pessoa, que permitiu inclusive que a historiadora Maria do Carmo reconstituísse sua biografia por intermédio de uma atenta leitura de seus poemas. Eis um exemplo marcante dessa característica: “Uma negra me levou a Deus e outra me levou para a macumba”. Em seu primeiro casamento ele se tornou evangélico devido a sua esposa ser presbiteriana, e no seu segundo casamento, como sua poesia diz, sua esposa o levou ao candomblé. Mesmo com passagens nessas religiões, Solano Trindade se declarava ateu.

Passou por vários lugares no Brasil: Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio Grande do Sul, Pelotas, Rio de Janeiro e São Paulo. Escreveu dois livros. Em “Poema de uma vida simples”, os versos de ‘Tem gente com fome’(Trem da Leopoldina) foram responsáveis pela sua segunda prisão no Estado Novo. Filiou-se ao Partido Comunista tão logo chegou ao Rio de Janeiro, em meados da década de 40. Quando morreu, no dia 19 de fevereiro de 1974, continuava militando pela causa socialista. Mas havia se desligado do partido por achar que problema do negro não era só econômico, mas racial.

Apesar de morto há mais de 30 anos, sua obra continua viva, na pele de cada brasileiro. “Um homem com idéias modernas, sensíveis aos sentimentos da população e que apesar de ter um conhecimento intelectual, ele fez a escolha de defender o povo que não teve muitas oportunidades na vida, com um conhecimento aberto e múltiplo de todos os segmentos populares”, afirma a professora de literatura Ivone Landim, idealizadora do Grupo Pó de Poesia.
Leia abaixo o seu Poema “Tem Gente Com Fome”.

Trem sujo da Leopoldina / Correndo Correndo/ Parece dizer/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome
Piuiiii
Estação de Caxias/ De novo a dizer/ De novo a correr/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome
Vigário Geral/ Lucas/ Cordovil/ Brás de Pina/ Penha Circular/ Estação da Penha/ Olaria/ Ramos/ Bomsucesso/ Carlos Chagas/ Triagem, Mauá/ Trem sujo da Leopoldina/ Correndo Correndo/ Parece dizer/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome
Tantas caras tristes/ Querendo chegar/ Em algum destino/ Em algum lugar/ Trem sujo da Leopoldina/ Correndo Correndo/ Parece dizer/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome/ Tem gente com fome
Só nas estações/ Quando vai parando/ Lentamente começa a dizer/ Se tem gente com fome/ Dá de comer/ Se tem gente com fome/ Dá de comer/ Se tem gente com fome/ Dá de comer/ Mas o freio de ar/ Todo autoritário/ Manda o trem calar
Psiuuuuuuuuuu.

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