Amor intraduzível

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

por Camilla Medeiros
Quando assisti ao filme “O amor nos tempos do cólera”, do diretor Mike Newell, fiquei um pouco decepcionada: ele não trazia a grandeza do melhor livro que já li até hoje. E não é exagero.

Logo depois entendi o desafio que era transpor para a telona a imensidão do texto do escritor colombiano Gabriel García Márquez. O próprio escritor salientou, ao vender os direitos autorais do livro, que Mike Newell não conseguiria a proeza. [http://g1.globo.com/Noticias/Cinema/0,,MUL154684-7086,00.html]

Ele não foi o único, pois livros como "Crônica de uma Morte Anunciada" e "Ninguém Escreve ao Coronel" também renderam fracassos cinematográficos. Apesar disso, o diretor Damián Alcázar pretende adaptar “Memórias de minhas putas tristes”, último romance publicado por Gabriel García Márquez.

Gabriel García Márquez narra em seu livro um amor que ultrapassa o tempo. Baseada no romance de seus pais, a história foi escrita com 'as entranhas', segundo o autor, e perpassa toda a vida dos personagens principais, Florentino Ariza e Firmina Daza.

As primeiras páginas foram difíceis, e como digo para todos os que indico, vale a pena o esforço de atravessá-las. Embora sua obra esteja associada ao realismo fantástico, em “O amor nos tempos do cólera” descreve com exatidão o cenário do enredo. O resultado de todo esse trabalho descritivo é uma viagem quase real para a América Latina do século XIX, com todas as precariedades e doenças que assolavam o continente. O título faz uma alusão a uma delas.

O que mais me chamou a atenção no livro é a sensibilidade do autor em relação à velhice. Esse período da vida, que sempre me soou melancólico, aparece no romance com suavidade e delicadeza. Nós o fechamos com a certeza de que a felicidade não está necessariamente ligada à juventude.

Além disso, o livro, com sua riqueza de detalhes e personagens, nos dá uma dimensão muito maior do que são as pessoas. Não há vilão, ou mocinho. Há seres humanos com desejos e fraquezas, que lidam com as consequências de suas escolhas sem se lamentar pelo que passou. Quer mais realidade do que isso?

Não é à toa que o ganhador do Nobel de Literatura de 1982 é autor da segunda mais importante obra hispânica: “Cem Anos de Solidão” - a primeira é “Dom Quixote de La Mancha”, de Miguel Cervantes.

Quando recebi a tarefa de escrever sobre o livro, demorei horas para fazê-lo, pois não sabia se conseguiria expressar toda a imensidão do texto. Assim como Mike Newell, minha intenção foi a melhor possível, mas Gabriel García Marquez continua sendo intraduzível

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