Sutil presença

sábado, 24 de outubro de 2009

por Dariana Nogueira

Nos dois dias intensos da III Conferência Municipal de Cultura, foi possível notar a variedade de atores sociais que compõe Nova Iguaçu. Homens e mulheres com ideias, pensamentos e propostas diferentes se fizeram ouvir, buscando para além da representação política, a intervenção direta nos assuntos públicos.

Essa dinâmica pôde ser visualizada antes mesmo desses dois dias reservados para a conferência geral, nas pré-conferências que ocorreram em sete bairros da cidade.

Em todos os momentos, em meio às reivindicações, debates, discussões, tensões e aplausos, apenas um olhar mais atento conseguiria notar a presença sutil da jovem Karina Vasconcelos, de 22 anos, que participou ativamente, porém de maneira bastante silenciosa, de todos os eventos que cercaram esta III Conferência Municipal de Cultura.

Karina é moradora de Nova Iguaçu e cursa Produção Cultural no pólo da UFRJ em Nilópolis. Estagiária do Espaço Cultural Sylvio Monteiro, ela tornou-se responsável pela relatoria da III Conferência, no popular, ficou com a parte mais chata e mais fundamental do evento.

Segundo Karina, o relatório sistematiza tudo o que foi debatido durante a conferência geral e as pré- conferências, resultando na apresentação oficial do evento. Por isso vemos Karina no canto, com olhos vidrados na tela do notebook, ou anotando tudo em seu caderninho.

Ela lamenta por não poder participar diretamente das questões propostas, de não expor suas próprias ideias e opiniões sobre esse momento tão importante pelo qual a cidade está passando. Contudo, situa seu trabalho num grau de relevância bastante alto, além de reconhecer que tudo está servindo, inquestionavelmente, para o aperfeiçoamento de sua formação profissional.

Ou seja, a renúncia se dá por uma causa maior e reconhecemos isso agradecendo à Karina por seu esforço  e contribuição imprescindíveis.

Proposta e viagens

por Hosana Souza

Tarde de sábado, segundo e último dia da III Conferência Municipal de Cultura. O teatro do Espaço Cultural Sylvio Monteiro lota para as apresentações das propostas discutidas durante a conferência. Os 512 inscritos na Conferência foram divididos em cinco eixos, e cada eixo deveria trazer dez propostas, sendo duas delas prioritárias.

Entre tantas idéias e ideais destacaram-se positivamente, entre o público, a proposta do eixo 1 sobre a construção de um calendário oficial e anual dos eventos culturais da cidade. A proposta do eixo 2 que defende que os Pontinhos de Cultura sejam transformados em política pública e a proposta do eixo 3 que visa à concessão de imóveis, equipamentos, terrenos desapropriados há 10 anos para entidades culturais e comunidades tradicionais.

Entretanto, há também propostas, digamos, impalpáveis, como a construção de um sambódromo, de um museu e de um teatro em nosso município, que seja no mesmo nível dos já existentes no Rio de Janeiro, além da proposta da construção de editais para pessoas físicas, onde elas se inscreveriam e receberiam verba também, o que abriria a possibilidade de fraudes.

Olhos atentos à tradição

por Larissa Leotério e Jefferson Loyola

Quem nos mostra que é importante olhar pra dentro de Nova Iguaçu com olhos e ouvidos atentos é alguém que nem mora na cidade: é a Iyalorisá Isabel de Oyá. Zeladora do Ilê de Oyá há 22 anos, ela acredita que Belford Roxo, a cidade onde vive, ainda é muito dependente de Nova Iguaçu. “A gente só tem a ganhar buscando sabedoria”, diz ela, justificando sua visita à Conferência Municipal de Cultura na manhã deste domingo.

Sobre a importância de conferências e fóruns culturais, a Iyalorisá conta que é preciso fazer com que as pessoas sintam orgulho de sua religião: “Quando alguém esconde sua religião para se beneficiar de alguma coisa, já está tendo preconceito consigo mesmo”, afirma. Ela acredita também que o preconceito vai sempre existir, com quaisquer religiões ou movimentos. Mas os congressos ajudam a entender e a aceitar.

Além da aceitação, outra bandeira que mãe Isabel levanta é a da conservação da tradição cultural dentro das casas de santo. E é por meio do Pontinho de Cultura que ela tem em Belford Roxo, a Associação Cultural e Recreativa Afoxé Raízes Africanas. O Afoxé surgiu dentro de seu Ilê quando se desvinculou do Afoxé Filhos de Gandhi, no dia 8 de dezembro de 2002. Além de dezembro ser o mês das Iyabás, o Afoxé é dedicado a Oxum, em homenagem a sua falecida mãe de santo, Dona Délia de Oxum.

“Hoje, muitos não se preocupam com políticas públicas, como a institucionalização”, observa. Para participar de editais públicos, os Ilês precisam ter CNPJ. “Uma casa sem CNPJ é uma pessoa sem identidade”, compara. A regularização faz com que o governo tenha condições de auxiliar as casas de santo. “Orgulho-me hoje de ter 34 anos de iniciada no candomblé e ter recebido a Digina (nome ritual) que Oyá me trouxe: Oyáguerê”, finaliza.

A outra face da cidade

por Camilla Medeiros

No longo debate do GT (Grupo de Trabalho) do Eixo Cultura, Cidade e Cidadania, Josenir de Fátima da Silva, popularmente conhecida por Irmã Fátima, destacou uma informação que muito tem a dizer sobre a cara da nossa cidade: as áreas rurais.

No ano de 1997 uma deliberação da Prefeitura de Nova Iguaçu ignorou um dado muito concreto: Nova Iguaçu possui áreas rurais. A partir de então, iniciou-se uma luta para comprovar que Nova Iguaçu possui áreas rurais. Sindicatos, vereadores e a sociedade civil dessas áreas se mobilizaram e quase dez anos depois, 2006, o atual prefeito Lindberg Farias sancionou uma lei reconhecendo doze assentamentos rurais na cidade.

Numa entrevista informal, no pátio do Espaço Cultural Sylvio Monteiro, Irmã Fátima, Presidente da Associação Rural Regional de Campo Alegre, presidente da ONG Sociedade Beneficente de Campo Alegre e membro da Comissão de Cultura de Nova Iguaçu, revelou uma outra face da nossa cidade.
--------------------------------------------------------------------------------



Dentro das discussões da III Conferência Cultural, a inclusão de mais personagens no cenário cultural da cidade foi uma das pautas principais. Quais são as suas expectativas?

“Minha bandeira aqui é lutar pela integração entre as áreas rurais e urbanas de Nova Iguaçu. Dentro da mesma cidade temos esses dois mundos, que ficaram sem diálogo durante muito tempo. Certas coisas que acontecem num ambiente não são divulgadas no outro. Por exemplo, você sabia que essas áreas rurais de Nova Iguaçu foram excluídas? Muita gente aqui não sabe disso também.”

Como é o trabalho da sua ONG?

“Dentro da ONG temos uma creche comunitária chamada Centro de Educação Infantil Comunitário Semente do Amor. Através dessa, creche realizamos anualmente a Festa da Roça, para resgatar a identidade da gente de interior. Temos danças sertanejas, com forró, comida típicas. Não é festa junina não, é festa na roça mesmo! Além disso, todos os anos comemoramos o aniversário do nosso assentamento. No dia 9 de janeiro, reunimos todos os moradores para um grande café da manhã, com os produtos da terra, que a comunidade cultiva. Nesse dia fazemos questão de lembrar os mais novos da luta que foi para conquistar a terra, e nos mobilizamos frente o governo para reivindicar as mudanças, e fazer um balanço do que foi feito, do que andou, do que não andou. Além de chamar a mídia para expor tudo o que é feito.”

Qual foi o resultado dessa exclusão dos doze assentamentos de Nova Iguaçu?

“Quando aconteceu essa exclusão, não tínhamos nenhuma ligação com a cidade a não ser o nome. Isso só consolidou a realidade que já existia. Sempre nos deportávamos para Queimados para tudo, médico, compras, enfim, a única coisa que ligava nossa região à cidade era uma escola da prefeitura de Nova Iguaçu, pois nem ônibus para cá temos. Até hoje precisamos ir para Queimados e depois vir para Nova Iguaçu.

A maioria das pessoas transferiu seus títulos eleitorais para Queimados, que foi a cidade que acolheu essa comunidade. Como eu vou votar em uma cidade que me excluiu? Até eu mesmo transferi meu título para Queimados.”

Qual foi o resultado do reconhecimento desses doze assentamentos?

“Quando o prefeito Lindberg Farias assinou a lei que reconheceu nossa região, imediatamente percebemos as mudanças. Não falo isso para engrandecer ninguém, mas depois de tanto tempo abandonados essa ida do prefeito a Campo Alegre foi essencial para que a gente se identificasse mais com a cidade. E soubéssemos que nossa existência para a cidade era importante. Formou-se uma aliança entre a nossa comunidade e a Prefeitura de Nova Iguaçu. Atualmente temos uma sessão eleitoral em Campo Alegre, da qual eu fui convidada para ser presidente, e todos votam em Nova Iguaçu novamente. Mas antes mesmo que tivéssemos essa sessão, a comunidade se interessou em transferir de volta seus títulos para a cidade, pois estávamos preocupadas com a possível mudança na gestão da Prefeitura, e o retrocesso frente aos avanços que conseguimos.”

Que impressão teve dessa conferência?

“Creio que o meu objetivo foi cumprido. As áreas rurais estão sendo visadas nessas propostas, e espero que a gente possa partilhar em breve da mesma política de incentivo cultural que as áreas urbanas possuem.”

Patrimônio da humanidade

por Wanderson Duke



Antes da plenária no teatro do Espaço Cultural Sylvio Monteiro que escolheu os novos delegados para o Conferência Estadual de Cultura, todos os agentes culturais ali presentes puderam adquirir um exemplar de um livro. Não, não foi apenas uma doação simbólica ou uma forma de presente. Foi o lançamento oficial do programa Livro Livre, organizado pelo poeta Moduan Matus e pelo escritor Écio Salles, mediador cultural da cidade de Nova Iguaçu.

Os dois já haviam organizado outros dois “testes”, um deles no bairro de Nova Era, para avaliar como o público receberia o programa. O resultado foi além das expectativas deles. Um dos livros “libertados” em Nova Era foi recebido por um morador da cidade do Rio de Janeiro (Centro). “Isso nos surpreendeu bastante, pois a proposta por trás do Livro Livre é que os livros não possuem donos, e são na verdade um patrimônio cultural da humanidade”, diz Écio Salles, que é secretário adjunto de Cultura de Nova Iguaçu.

Cultura cidadã

por Camilla Medeiros

“Essa conferência representa um ponto de equilíbrio entre o público e o privado”. Com essa fala, a assistente social pernambucana Sandra Mônica iniciou os debates do eixo Cultura, Cidade e Cidadania. Ela lembrou em seguida que um dos principais objetivos da III Conferência de Cultura da Cidade de Nova Iguaçu é abrir um diálogo produtivo entre esses dois agentes.

Ontem, esse mesmo grupo havia levantado algumas questões a serem pensadas para a mudança do atual cenário cultural da cidade. E a pauta da reunião de hoje centrava-se na análise, discussão e construção de dez propostas, sendo duas delas prioritárias.

Diversidade amarela

por Josy Antunes

Durante a abertura da III Conferência Municipal de Cultura, na primeira mesa formada no teatro do Espaço Cultural Sylvio Monteiro, Maria Antônia Goulart, coordenadora do Programa Bairro-Escola, explicitou sua satisfação ao ver que, no público formado no local, um grande número de adesivos amarelos destacavam-se entre os coloridos das roupas. A seu lado, o próprio Secretário de Cultura e Turismo, Marcus Vinícius Faustini, exibia um deles, centralizado em sua camisa branca. Em letras vermelhas, a exclamação podia ser lida: “Eu sou Pontinho”. “Vendo daqui, a gente vê como, de fato, é uma ação que está promovendo uma transformação”, disse, orgulhosa, a primeira dama da cidade. “Os pontinhos não estão presentes só nos seus bairros, territórios e ações. Eles estão presentes como militantes, como construtores da política cultural e democrática de Nova Iguaçu”, continuou.

Cara nova

por Nany Rabello

Jovens descolados, conversando animadamente, expondo ideias e participando ativamente de debates de cultura. Há alguns anos, isso era difícil de ser imaginado. Hoje é realidade. Na III Conferência de Cultura de Nova Iguaçu é a cara dos jovens que é mostrada.

"Foi-se o tempo em que a cultura era só ir ao o cinema, ao teatro. A cultura precisa ganhar as ruas e não ficar restrita a quatro paredes", afirmava Bruno de Souza Santos, de 19 anos, que participou nos dois dias da conferência. Bruno é um dos jovens que querem fazer algo melhor da cultura do nosso país.

Histórias de amor

por Wanderson Duke

Manto de preocupações, colcha gigante de retalhos das possibilidades e uma legião de adultos preocupados com a forma de trabalho da cultura nas escolas: Todos os ingredientes perfeitos para a III Conferência Municipal de Cultura que está ocorrendo em Nova Iguaçu.

Mas, em meio a tantos dilemas existencialistas e propostas de dinâmicas da cultura na cidade, uma história de amizade entre duas crianças e amor aos livros se forma no segundo andar do Espaço Cultural Sylvio Monteiro: Waldemir Junior, 9 anos, aluno da Escola Estadual Machado de Assis, em Mesquita, e Samira dos Santos, 8 anos,aluna da Escola Estadual Arco-íris,em Caioaba, Nova Iguaçu.

Ambos estavam descortinando a magia dos livros ali mesmo, na biblioteca do Sylvio Monteiro, compartilhando ambos a amor pela leitura.

Samira conta que seu contato com os livros vem desde cedo, que contou com a ajuda de sua mãe para desenvolver sua paixão pela leitura. “ O primeiro livro que li foi ‘O Menino Maluquinho’, do Ziraldo, quando tinha apenas 5 anos. Adorei”, conta a empolgada Samira. A menina veio acompanhada pela avó que, segundo a ela, sempre foi envolvida com cultura na cidade e suas mais variadas formas artísticas.

Já com Waldemir a situação é um pouco diferente. O interesse pelas obras literárias o segue desde berço, segundo conta sua mãe, Leoneida Rosa dos Santos, sua grande incentivadora nessa grande trajetória que ele tem pela frente. Leoneida é atriz há cerca de dois anos.

“Ela sempre me incentivou a ler, mesmo antes de trabalhar com teatro. Depois que ela fez a peça ‘A invasão’, meu interesse aumentou", diz Júnior, cuja leitura preferida é 'A Turma da Mônica', de Maurício de Souza. “Não gosto de Homem-aranha nem do Superman", afirma, para acrescentar em tom patriótico. "Os melhores gibis e as melhores histórias são nossas”.

Samira e Waldemir lamentam o fato de não haver bibliotecas em seus bairros, nem nas escolas em que estudam. “Se não fosse minha mãe comprando livros e gibis para mim, eu quase não leria nada”, diz Junior. “Se tivesse um biblioteca, pelo menos na escola, iria ser muito legal. Eu ia ler muito, muito mesmo. Principalmente ‘O Menino Maluquinho’, finaliza Samira.

De mãos dadas

por Dariana Nogueira

Uma das 500 pessoas que participou da III conferência de Cultura de Nova Iguaçu foi Delmar José da Silva, que vem a ser o secretário de cultura de Mesquita. No cargo desde março de 2007, ele faz uma associação entre o evento e o momento singular pelo qual vem passando a Baixada Fluminense como um todo, no âmbito cultural especialmente. "A conjuntura é altamente favorável à Baixada desde que Gilberto Gil assumiu o Ministério da Cultura", afirma o secretário.

Embora reconheça a importância das mudanças implementadas nacionalmente, Delmar da Silva não deixa de reconhecer o surgimento de lideranças municipais eficientes no campo da cultura, que souberam traduzir para seus respectivos territórios as novas políticas nacionais. "As lideranças locais têm se mostrado eficientes em propor políticas satisfatórias, aproveitando o momento favorável e potencializando os movimentos culturais locais."

O secretário aponta para certa uniformidade nos municípios da Baixada. Como há uma identidade comum entre os territórios, é possível pensar em políticas regionais onde a Baixada inteira seja contemplada. Mas para isso é preciso que haja um diálogo entre os responsáveis pela implementação de políticas culturais na região. "Municípios como Caxias, e sobretudo Nova Iguaçu, alcançaram avanços significativos do ponto de vista sistêmico no que diz respeito ao desenvolvimento cultural, mas havendo diálogo intermunicipais é possível estender esses avanços aos demais municípios".

Delmar da Silva acredita que as conferências municipais de cultura são o palco por excelência para o diálogo preconizado por ele, e não foi à toa que fez questão de marcar presença no Espaço Cultural Sylvio Monteiro no dia de hoje: "Eu tenho participado de diversas conferências, justamente por acreditar no diálogo, na interatividade entre municípios distintos, etc. Mas a realização da conferência é essencial porque é o momento onde a organização e a sistematização do movimento cultural são pensadas, discutidas e ampliadas, contando com a participação de todos, que é o mais importante."

A voz de Cabuçu

por Edson Borges Vicente e Fernanda Bastos



Um grupo de seis agentes culturais do bairro Cabuçu participa da III Conferência Municipal de Cultura. Com diversas funções, todos atuam na Escola Municipal Abílio Ribeiro. O objetivo do grupo é representar o bairro nas discussões dos grupos de trabalho.


Nádia Luiza Filgueiras Ponciano, 26 anos, é professora do primeiro segmento do ensino fundamental há oito anos na escola. Estudante de matemática da Universidade Federal Rural de Nova Iguaçu, ela é a coordenadora de aprendizagem e tem a responsabilidade de organizar as ações da equipe de mediadores da escola. Convidada pelos mediadores ela veio à conferência para aprender. “Tenho muito contato com a SEMED. Vim para ficar por dentro do que está se discutindo na cultura. Isso é importante para potencializar meu trabalho com os mediadores” ressalta ela.

Dos cinco mediadores que acompanham a coordenadora, três são estudantes de Letras: Alessandra Aparecida Souza de Paula, 26 anos, trabalha com oficina de jornal há seis meses com crianças de 7 a 12 anos. Carlos Vinicius Moreira Assis, 21 anos, faz o mesmo e ainda desenvolve oficinas de técnicas de redação no ‘Escola Aberta’ da mesma escola. Já Carmem Inês Bispo, 32 anos, ajuda as crianças na árdua aprendizagem matemática.

Um casal muito interessante finaliza a composição do grupo de agentes culturais. Trata-se de Elisângela Melo, conhecida pelos jovens do Projovem como ‘ Fofão’, desde que trabalhou no projeto Minha Rua Tem História no ano passado no Abílio. “Fofão”, juntamente com seu esposo Odil Fonseca Barreto, trabalha com oficinas de banda. Odil ainda dá aulas no Brasil Alfabetizado e é parceiro do Bairro Escola. Os dois fazem parte do Pontinho de Cultura “Cultura Viva nas Comunidades”, que assistirá 280 alunos do 6ª ao 9ºano na Escola Municipal Profº Leonardo Carielo de Almeida, em Lagoinha.

Para Alessandra, conhecer as propostas também é importante e algo que a conferência proporciona. “Entramos em contato com pessoas com experiência na área da cultura”, afirma.

Odil apresenta a proposta do grupo que trata da escolha dos mediadores, dando oportunidades aos moradores dos bairros. Assim como ocorreu no concurso para agentes de saúde, onde os candidatos deveriam residir na área pretendida, os mediadores devem ser escolhidos na localidade. “Cada local deve ser trabalhado pelos próprios moradores. Assim, além de gerar oportunidades para todos, não teremos problemas com questões de segurança. Pois, uma vez sendo moradores do bairro fica mais fácil para os mediadores atuarem. Não tem esse negocio de ‘aqui não pode entrar por que é perigoso’. Desse modo haveria produção cultural em todas comunidades. Essa é a voz de Cabuçu” explica.

Revolução híbrida

por Josy Antunes

Em um discurso carregado de emoção, Ana Lúcia Pardo – a representante do Ministério da Cultura – trouxe para o teatro do Espaço Cultural Sylvio Monteiro, onde está acontecendo a III Conferência Municipal de Cultura de Nova Iguaçu, um pedaço do que foi a 1ª Conferência Cultural de Belford Roxo, cidade vizinha, onde também esteve presente. Os encontros aconteceram em quatro dias, os dois últimos, 15 e 16 de outubro, na Câmara Municipal.

“Belford Roxo é como Nova Iguaçu”, comparou ela, fazendo uma ligação da grande inquietação artística presente em ambas cidades. O acontecimento era um anseio existente desde 2003. Por ser a primeira, e pela forma como foi desenvolvida, mobilizando uma considerável quantidade de agentes culturais, vindo dos mais distintos pontos da cidade, a conferência pode ser considerada um marco histórico. Mas, para além disso, Ana Lúcia Pardo sensibilizou-se especialmente com uma apresentação regida pelo músico Dida Nascimento, que descreveu como se ainda pudesse visualizá-la. “Eu cheguei lá e vi a forte presença da música e de outras ações. Um momento em que diferentes expressões ocupavam aquele lugar, que é um espaço legislativo. Eu acho que foi simbólico”, declara.

O momento de pura emoção teve seu início em reuniões anteriores à conferência, quando Dida teve a ideia de congregar, num limite de tempo de vinte minutos, as manifestações artísticas da cidade. A “primeira lida", a tarefa pode parecer fácil, mas quando passa-se a enumerar a quantidade e diversidade dessas manifestações, a visão torna-se totalmente contrária. “Nós tivemos poesia, teatro, dança e música. Teve uma orquestra de berimbau, vários atabaques – uma coisa mais tribal - , bateria, baixo, teclado – que são instrumentos mais sofisticados, mais fáceis de se ver, normalmente – e tivemos também a inserção de música gospel”, relaciona o artista.

O primeiro desafio foi encontrar pessoas que estivessem dispostas a encarar o experimento. Depois – e talvez num grau de dificuldade maior – era preciso agrupar todos para os ensaios. “Eu tive uma tarefa árdua de reunir todos. Ensaiamos pouquíssimas vezes, mas sempre separadamente. Não consegui reunir o grupo todo”, conta Dida. Entretanto, os contratempos não impediram o sincronismo apresentado na conferência. “Ele regendo aquilo tudo, eu fiquei encantada, emocionada”, confirma Ana Lúcia Pardo, lembrando sua fala em reação ao que tinha acabado de observar: “Essa mistura dos diversos tipos de música que está acontecendo aqui, essa hibridação, tem que significar pra nós, gestores públicos, privados, poder legislativo, executivo e sociedade civil, um exemplo de sinergia, que é isso que a gente está buscando no sistema nacional de cultura”.

A música que selou a união dos quase 30 artistas era uma composição do próprio Dida Nascimento, cuja letra traz a autoria da poeta Ivone Landim e a musicalidade da capoeira. “Ela fala da mãe preta, aquela mãe que cuida do seu filho. No nosso caso, da nossa conferência, da nossa arte, dos nossos artistas”, explica o idealizador da apresentação. As já citadas linguagens artísticas recebiam o complemento de um coral que produzia murmúrios e lamentos, transcorrendo paralelamente às outras atividades. “O Hip Hop existe sozinho, no sentido de que é uma expressão específica de cultura. A capoeira também, historicamente tem sua representatividade e é a terceira maior expressão presente no país, e assim vai...”, principia Ana Lúcia, “Mas, quando se juntam, provocam uma nova coisa.

Na 1ª Conferência Cultural de Belford Roxo, foi formado o Conselho de Cultura, no qual Dida Nascimento está incluído, e que representará a cidade nas próximas etapas, como a II Conferência Nacional de Cultura. “O próximo passo é defender as propostas levantadas na nossa conferência e tentar convencer o Governo Estadual e Federal que existe uma necessidade muito grande, decorrente de uma carência de muitos anos, de cultura e entendimento”, defende Dida, concluindo: “O nosso município tem um valor muito grande com relação a arte”.

Minha primeira conferência de cultura

por Lívia Pereira.

Uma colcha de retalhos bem diversificada se estendeu sobre o domingo ensolarado no Espaço Cultural Sylvio Monteiro. Diversos rostos, coloridos, sorrisos, expressões, enfim, presentes nos artistas, entidades, estudantes, cidadãos em geral.

Em meio a tanta diversidade, caras novas deixam no ar uma pergunta: o que as trouxe aqui? Que inquietações provocaram a vinda dessas pessoas? Tentando responder a essas perguntas, hora de lançar a dúvida em quem pode saná-la.

Estudante de Letras, cursando o 6º período da faculdade, moradora de Nova Iguaçu, Grace Silvério conta que a curiosidade a tirou de casa. "Uma amiga da faculdade me ligou e falou sobre a conferência. Como eu estava em Nova Iguaçu, passei pra dar uma olhada." Além disso, seu interesse cresceu por ter vários amigos envolvidos com música e teatro: "Quero levar a eles essas informações. Será que ainda dá tempo de eles participarem?"

Diálogo cultural

por Hosana Souza / Fotos: Josy Antunes


Apesar do grande atraso nessa quinta-feira, o deputado Alessandro Molon marcou presença na III Conferência Municipal de Cultura. Mesmo preso em dois engarrafamentos a caminho do Espaço Cultural Sylvio Monteiro e com sua agenda sempre lotada, ele fez questão de aceitar o convite de Ana Lúcia Pardo, representante do MINC no estado.

“Eu tenho participado o máximo que posso, ido em todas as conferências que são possíveis”, diz Molon, que acredita que a Baixada não pode mais ser vista como cidade dormitório. Para o deputado inicialmente é necessário o diálogo entre as ações culturais, a sociedade civil e o poder público. “Se a sociedade civil se mobiliza, suas conquistas serão valorizadas, e elas serão temidas pelo poder público”. Molon acredita que todas as cidades devem ser convocadas para discutir as verbas da cultura.

“Correndo o estado e observando os municípios, eu percebo que as propostas não devem ser dadas por nós, poder público. Elas já nascem nos municípios, daqueles que fazem a cultura acontecer nesses locais por quem conhece a realidade”. O deputado acalorou os debates e não parou em momento algum de enfatizar a importância da participação da população. Segundo o político, é justamente pela importância desses processos que se construirá um sistema nacional de cultura, e esse sistema deve ser criado de baixo para cima, isto é, da sociedade civil para os governos.

Conselho do poeta

por Edson Borges Vicente


Poeta desde os tempos obscuros da ditadura, Jorge Cardozo, 50 anos, vive hoje uma grande responsabilidade: presidir o Conselho Municipal de Cultura de Nova Iguaçu. Ele se entregou à arte em 1978, quando ingressou no Grupo ‘Calabouço’, grupo iguaçuano de resistência no qual fez teatro e poesia. Segundo Jorge, o grupo escolheu esse nome em homenagem ao restaurante onde foi morto o estudante Edson Luiz Lima Souto, assassinado em 1968, aos 18 anos, em uma operação de repressão, durante a ditadura militar.

Atual subsecretário de Cultura e presidente do conselho desde sua reorganização, em 2005, o poeta conselheiro busca levar a voz da democracia e resgatar a identidade da cultura popular. Jorge Cardozo diz estar totalmente afinado com a proposta de inclusão e participação do Ministério da Cultura – MinC. "Essa é uma proposta que entende que a cultura na verdade é de todo povo brasileiro”, afirma. Segundo ele, a proposta do MinC é a mesma da secretaria municipal.

Para o conselheiro, as mudanças na lei de incentivo à cultura – a Lei Rouanet - são muito importantes. E vão se tornar ainda melhores com a aprovação da chamada Pec 150, proposta de emenda constituicional por intermédio da qual 2% do orçamento federal serão alocados para a cultura. "Precisamos fortalecer o Fundo Nacional de Cultura e espalhar a presença do governo na esfera da cultura nos diferentes recantos do país, acabando com essa diferenciação tão forte que existia e ainda existe entre centro e periferia, entre cidade e bairro , entre zona urbana e rural ricos e pobres”.

Quadrilha também é cultura

por Larissa Leotério

Uma cultura muito forte e muito viva em Nova Iguaçu é a das quadrilhas de dança caipira. E estão muitíssimo bem representados na III Conferência Municipal de Cultura de Nova Iguaçu. Apesar das muitas deficiências e principalmente por causa delas, os componentes dos grupos vieram em peso.

É sobre essas deficiências que me conta Vagner Vinícius, de 32 anos, quadrilheiro de Jardim Pitoresco e membro da Liga Independente das Quadrilhas Juninas de Nova Iguaçu (LIQUAJUNI). “Somos nós que procuramos as costureiras, fazemos as alegorias”, conta, comparando com preparativos de uma escola de samba.

Engana-se quem pensa que só as quadrilhas só se articulam às vésperas das festas juninas. Os quadrilheiros se preparam o ano inteiro. Ensaiam com muita antecedência. “Temos muitas preocupações. Tem que ter coreografia, e coreografia atualizada. Não é a mesma coisa todos os anos”, conta.

Quando está tudo pronto, com as coreografias ensaiadas e as roupas costuradas, eles saem à procura de locais pra se apresentar. “Nós organizamos nossas festas, mas procuramos outros arraiás, pra divulgar”. Segundo Vagner, o maior problema é a falta de divulgação. Quando tem competições, nem sempre ficam sabendo, ou não podem participar. “Não temos apoio e não recebemos ajuda nenhuma”, afirma.

Alan Medeiros, de 19 anos e também morador de Jardim Pitoresco, conta quem há quadrilhas de 20 anos ou mais participando da LIQUAJUNI e que não tem divulgação nem o reconhecimento merecido: “Acho que poderiam nos dar pelo menos metade do reconhecimento que dão às escolas de samba”, desabafa Alan. Para ele, com essa ajuda viriam competições mais abertas e mais divulgadas, como o Carnaval de Nova Iguaçu, o segundo maior do Estado.

Outra liderança de grupo caipira que está presente é Telma Lúcia Brito, do grupo 'Estrela Guia', de Rosa dos Ventos. Telma fundou o grupo quando o já existente no bairro se desfez. “Já existia a cultura das quadrilhas. E quando o grupo que tinha acabou, as pessoas reclamaram muito”, conta. O grupo ‘Estrela Guia’, existente desde 2002, também pede mais apoio. “É uma luta custear tudo do próprio bolso”, diz com certo desânimo.

O presidente da LIQUAJUNI, João Gomes, foi quem contatou pelo menos um representante de cada um dos 20 grupos da Liga. Ele diz estar satisfeito com a conferência e com a democratização da cultura na cidade: “Agora eu volto a acreditar que pode dar certo”, confia. João Gomes, que participou ativamente no debate de diversidade cultural no primeiro dia da conferência, vai pedir auxílio na organização de competições e festivais. “Quadrilha também é cultura”. Afinal, todo mundo é cultura.

Um Edson*, um poeta e um conselho

por Edson Borges Vicente

Jovem repórter faz homenagem ao poeta Jorge Cardozo, presidente do Conselho Municipal de Cultura


De onde vem a força do poeta
Sobrevivendo em tempos obscuros
Tentando escapar do calabouço
e ver nascer o sol da liberdade?

Talvez venha do espírito de união
Da arte que o palco da vida ensina
Expressada nos espaços operários
Nas caras e nas bocas da cidade

E como imaginar tamanho feito
De ver raiar a luz da esperança
E das palavras tristes do poeta
Surgir a firme voz da liderança

E ao fim sentir que todos temos vida
Que a arte não está no cativeiro
Repousa sobre o velho e o moço
Desperta no coração da criança

Talvez se não morresse o tal menino
Ainda estivesse presa, a poesia
E a força e a garra do poeta
Fosse tal qual agulha no palheiro

Melhor é resistir à repressão
Seguir a cultura da ousadia
Viver do jeito que mais vale à pena
Conselhos de um poeta conselheiro

* Referência ao estudante Edson Luiz Lima Souto, assassinado em 1968, aos 18 anos, em uma operação de repressão, durante a ditadura militar (ver matéria 'Conselho do poeta')

A sala da diversidade

por Nany Rabello

A 5° mesa de debate da III Conferência de Cultura da Nova Iguaçu também pegou fogo. O tema, Gestão e Institucionalidade, foi abordado das mais dinâmicas maneiras e as propostas pareciam surgir a cada segundo, em meio à diversidade dos presentes. A sala que começou vazia terminou repleta não só de pessoas como de ideias e propostas, além de várias explicações e esclarecimentos sobre o que é a Gestão de Cultura.

Coordenada pela representante do Ministério da Cultura Ana Lúcia Prado, a relatora Deise não teve problemas na hora de organizar as propostas formalmente. A representante do MINC estava acompanhada de Marcelo Cavalcanti, subsecretário de Cultura e Turismo de Nova Iguaçu, na mesa. Juntos, não deixavam nada passar em branco. “O difícil não é elaborar algo, o difícil é fazer com que se aprove o que foi elaborado”, diz Marcelo.

Parece que a sala incorporou a proposta de diversidade do secretário Marcos Vinícius Faustini, pois representantes de associações de moradores dos bairros de Nova Iguaçu, professoras, fotógrafos, e demais camadas de agentes culturais estavam representadas.

 
 
 
 
Direitos Reservados © Cultura NI