Meninos de palco

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

por Jéssica de Oliveira

O Cecom produziu ao longo deste ano de 2009 a esquete Diário de Um Menino de Rua, que estreou na tarde da última quinta-feira no teatro do Espaço Cultural Sylvio Monteiro com grande sucesso. A peça aborda o cotidiano de menores que têm as ruas das cidades como casa, envolvendo a triste realidade desses meninos com a sensibilidade do circo, da dança e até mesmo dos contos de fadas. “O grupo resolveu colocar na peça a delicadeza das fadas e a alegria do circo para dar à história um ar mais leve, já que este é um assunto muito sério e triste”, explica Denise Emanuele, que foi a responsável pelo roteiro e direção da peça.

Com o apoio da equipe do Cecom, o grupo de adolescentes que participam do Pro-Jovem em Vila de Cava, pôde obter um excelente resultado. Eles tiveram ajuda das oficineiras Denise Emanuele (interpretação), Líliam Lopez e Kátia Vidal (coreografia) e o Carlos Alberto (cenografia), que se limitaram a dar uma mãozinha. Basicamente, quem deu as ordens por lá foram os próprios jovens.

Todos bem acomodados em seus lugares? As luzes do teatro se apagam – os responsáveis pela iluminação são alguns meninos do Cecom – e a plateia ouve vozes de jovens cuja entonação demonstra sofrimento. São os quatro meninos de rua que vêm pedindo: tia, me dá um real, aí? O espetáculo mal começou e quem o assiste já não consegue desgrudar os olhos daquelas figuras maltrapilhas. “As pessoas vê a gente como o lixo da sociedade”, diz um deles em um português tão ruim quanto sua condição de vida.

A história revela os motivos pelos quais aqueles meninos estão na rua. “Eu saí de casa porque meu padastro abusava de mim”, explica o primeiro. Esta, segundo os próprios atores em um bate-papo após o espetáculo, não é uma verdade exclusiva da ficção. Eles contam que, além de terem se inspirado em filmes e reportagens sobre o assunto, extraíram muitas informações do cotidiano que vivem. “Para alguns daqueles jovens, a montagem dessa peça foi um grande desabafo, uma maneira de falarem sobre o que muitas vezes acontece em suas famílias”, explica Andreia de Oliveira, coordenadora do Pro-Jovem no Cecom. Segundo Andreia, esses jovens tiveram oportunidade de contar que o que faz muitos menores saírem de casa é a falta de carinho e apoio em seus lares.

Ao contrário do que se esperava, a culpa por tantos jovens terem as frias calçadas como cama e viadutos como teto não é inteiramente do governo. Quem prestou atenção, pôde ver que os meninos de rua não se queixavam dos problemas na sociedade. “A família é a base de tudo”, disse Cineide Reis, 40 anos, depois do espetáculo. “Os meninos de rua não são da rua; eles apenas estão. Se eles não recebem atenção e são mal tratados em suas casa, eles simplesmente saem, e isso é muito triste”.

A coordenadora Andrea de Oliveira tem exemplos concretos para mostrar que, mais importante do que escolas, áreas de lazer ou condições de moradias, os meninos de rua precisam do sentido de família e dos valores que se perderam nos lares brasileiros. “No nosso grupo existem pais que não apoiam nem acreditam no potencial de seus filhos e isso reflete em suas ações. No começo da montagem da peça, houve uma mãe que disse que sua filha não iria conseguir atuar, mas nós a encorajamos e hoje ela estava lá, brilhando naquele palco. A mãe ficou de boca aberta”, conta Andreia, rindo orgulhosa do trabalho de “seus jovens”.

0 Comentários:

Postar um comentário

 
 
 
 
Direitos Reservados © Cultura NI