Contrariando expectativas

quinta-feira, 22 de abril de 2010

por Hosana Souza

Quarta-feira, 21 de abril de 2010. Manhã quente e o início de um feriadão. Eram oito da manhã quando parti de Campo Grande. Confesso ter atravessado algumas horas repletas de desesperança, imaginando que chegaria em Miguel Couto e não encontraria ninguém além da produção do evento. E mais uma vez o Iguacine contrariou as expectativas, pois às dez da manhã já se reunia na Escola Livre de Cinema um grupo de 20 pessoas ansiosas pela próxima oficina, mesmo após sete dias de evento.



O Curso Livre de Interpretação, o primeiro curso realizado durante o evento, foi dividido em duas partes: uma comandada por Rodrigo Fonseca, realizada no último domingo no Espaço Cultura Sylvio Monteiro e outra realizada ontem, comandada por Celina Sodré na Escola Livre de Cinema. “Foi a primeira vez que montamos um curso durante o Iguacine, e a resposta foi excelente, levaremos isso para o próximo evento. Estamos pensando, também, em montar uma turma com aulas de interpretação aqui na Escola, talvez até no próximo semestre. Normalmente nós focamos mais na produção, edição, filmagem, queremos formar, também, bons atores”, explica Anderson Barnabé, coordenador da escola.

Rodrigo Fonseca é professor e critico de cinema pelo jornal O Globo. Participa ativamente do Iguacine desde a segunda edição, fazendo a curadoria dos longas exibidos no festival. Este ano comandou a primeira oficina de Interpretação do evento, que consistiu em um descontraído bate-papo, onde as duvidas foram respondidas e situações pontuadas. “Aprendemos muito. Ele explicou o que era interpretação, a diferença entre interpretação para teatro e cinema, além de introduzir o texto que trabalharemos hoje com a Celina”, explica Mauro Vasconcelos, estudante de Letras pela UFRRJ.


A segunda parte do Curso Livre de Interpretação foi dirigida por Celina Sodré, atriz há mais de 30 anos e professora há 15 anos da CAL – Casa das Artes de Laranjeiras. “Nunca tive incentivo para seguir essa profissão, mas eu sempre tive uma grande determinação. Se algum de vocês realmente deseja seguir esse caminho, aprendam agora a amar as dificuldades”, pontuou Celina.

Grande mestre
A oficina, que teve inicio às dez da manhã e terminou às cinco da tarde, foi dividida em três partes: teórica, visual e prática. Celina introduziu os participantes no universo de Stanislavski, para ela o grande mestre da interpretação. “Ele foi um homem extremamente determinado e dedicou toda sua vida ao teatro; ele revolucionou a arte”, explica Celina. “Antes de Stanislavski, o teatro era apenas a leitura de um texto; uma ‘decoreba’, não existiam artistas, eram meros contadores de um texto. Já ele iniciou o teatro de arte, onde o público pode enxergar não uma pessoa e um texto e sim um determinado personagem. Ele fez com que existisse um conhecimento sobre a arte a ponto de hoje podermos estar aqui dando uma aula para formar atores. Foi, também, o fundador do Teatro de Arte de Moscou”, narrava Celina, acompanhada por olhos atentos e mãos ativas nas anotações.

O segundo momento do dia contou com a exibição de trechos do longa sueco “Persona - Quando Duas Mulheres Pecam”. O filme narra a história da enfermeira Alma contratada para cuidar de Elisabeth, uma atriz que, embora em perfeito estado de saúde, não pronuncia uma palavra. “Nesse momento, quero que vocês prestem atenção nas cenas e nelas, nas ações que são completas. Nas mãos, nos pés, na respiração; tudo que elas fazem completado pelo texto faz com que nós realmente acreditemos na história”, diz Celina.

Sobre “Persona”, Celina comentou: “Eu recomendo que vocês assistam ao filme inteiro. Inclusive, estou deixando para vocês uma bibliografia e uma filmografia básica. Dos filmes, eu peço que vocês não desistam se em um primeiro momento vocês acharem chato, é difícil treinar a visão para bons filmes, estamos acostumados a porcarias, devemos nos reeducar até nisso”, explica a atriz, que é completada por Barnabé. “Estamos acostumados a ver novelas, aquelas porcarias que não passam de um comercial mais longo; com histórias vazias e que só deixam a população cada dia mais ignorante. Temos bons atores, muita gente boa fazendo cinema, e muito cinema bom internacionalmente. Não é brincadeira, assim como criaram o movimento ‘Off Broadway’, temos que criar o ‘Off Globo’”.

Autoexposição impiedosa
Iniciando o terceiro e último momento do dia, a jovem atriz Paula Neves interpretou Alma, reproduzindo uma das cenas do longa e despertando nos alunos a atenção para os detalhes: “Agora que vocês já conhecem a cena, eu peço que prestem atenção nos movimentos. Para cada cena há uma partitura, que consiste em aliar cada palavra a uma determinada ação. Por exemplo: Uma vez – pega a colher, Cal e eu – roda a colher, é fruto de muito ensaio, torna-se quase orgânico”, explica a atriz, que foi aluna de Celina na CAL e há dois anos a acompanha.

Celina propõe, então, que cada aluno pegue uma frase do texto proposto por Rodrigo e a transforme em uma ação: “Deve ser real, não importa se vocês têm de repetir cinquenta vezes. Ser ator é se autoexpor impiedosamente, é colocar um pouco de si e sentir realmente cada emoção”.

No fim da tarde eram incontáveis os comentários e elogios a Celina, à oficina, ao Iguacine. “Eu caí aqui de paraquedas. Gosto muito de eventos culturais e quero me aproximar mais disso tudo, participei do Iguacine e resolvi experimentar a oficina. De todos os dias não há nada o que reclamar. O festival não deixou nada a dever para ninguém”, disse Mauro Vasconcelos. E entre os aplausos da produção e dos participantes da oficina foi encerrado o III Iguacine, que já deixou saudades.

2 Comentários:

Anônimo disse...

Sannah vc está morando em Campo Grande??-o.O-??

Anônimo disse...

Lindo texto..coerente...sensível...
a sua cara...meu anjo...
Parabéns

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