Atraso do ônibus

quinta-feira, 8 de abril de 2010

por Tuany da Rocha

Muitos estão acostumados a subir em ônibus lotados de estudantes da rede pública, e a relacionar a camisa cinza, surrada e esgarçada com a de crianças e adolescentes mal-educados, desbocados e baderneiros. Esse é o caso da universitária Michele Oliveira, de 23 anos, que se irrita muito com a bagunça que os estudantes fazem dentro dos ônibus. “Me irrita quando eles entram como um bando, fazem maior bagunça e jogam as mochilas em cima das pessoas. Os estudantes não pagam nada, atrasam a viagem, incomodam e ainda sentam quando alguém levanta. Sou a favor que haja uma lei que proíba estudantes de sentar quando tiver passageiro pagante em pé.”

Mas e aí, será que a grande maioria das pessoas que viajam nos transportes públicos conseguem enxergar as situações constrangedoras que estes jovens passam diariamente? A estudante Raquel de Macedo, de 16 anos, conhece bem o sentimento de revolta. ”Tenho que sair de casa sempre uma hora antes porque sei que terei que esperar mais ou menos isso no ponto pelo meu ônibus, que às vezes demora ainda mais e chego atrasada”, diz ela. O drama volta a se repetir na hora da volta para casa, quando ela chega a passar pelo menos 45 minutos até que uma alma boa pare o ônibus no ponto em frente a sua escola.

O artigo 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente diz que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”. A lei é a lei, mas e a realidade como é?

Que o digam as filhas de Fernanda Ribeiro, estudantes do Colégio Estadual Afonso Cavalcante, no Largo do Machado, na Zona Sul do Rio de Janeiro. As meninas, de 16 anos, foram obrigadas a descer do ônibus porque no lugar do Riocard apresentaram uma declaração escolar alegando que o cartão estava pra chegar. “Minhas filhas ficaram tão atônitas quando a trocadora as impediu de continuar no ônibus, que tiveram medo de pegar outro ônibus e acabaram indo a pé do Passeio até o Largo do Machado”, conta a mãe, revoltada.

Violência
A questão é que a cada dia que passa essas viagens estão levando o futuro da sociedade para uma realidade mais violenta. “Vai ter um dia que os estudantes vão se cansar da humilhação e vão partir para a violência”, afirma Victor Rodrigues, de 17 anos. O estudante teme que ocorra situações piores para os motoristas e os trabalhadores que não os respeitam.

É normal ver um ônibus passar direto por um ponto lotado de estudantes. Alguns motoristas dizem que é ordem da empresa deixar subir um número especifico de estudantes, mas eles sabem o quanto é difícil esperar um ônibus durante horas debaixo do sol de meio-dia, e ainda correndo o risco do mesmo passar direto e ignorar o sinal. “Porque fazem isso com tanto gosto?”, indaga Rafael Silva, de 16 anos.

Em meio a tantos relatos cabe um questionamento, se existe uma lei que não é respeitada, não existe a quem recorrer? Resposta da empresa REAL AUTO ONIBUS LTDA. "A Real Auto Ônibus Ltda. agradece a crítica e colaboração externadas, pois temos a certeza de que o vosso intuito é contribuir para que a empresa mantenha a excelência na prestação do serviço, razão pela qual analisamos minuciosamente as diversas opiniões dos nossos clientes. Entretanto, ressaltamos que de acordo com a Lei n. 3167/00, os usuários devem apresentar o cartão Rio Card para assegurar o direito à gratuidade nos ônibus municipais", respondeu o funcionário que recebeu o email mandado pela redação do culturani, que assinou como Departamento de Tráfego.

Desrespeito com quem acorda cedo
Natália Santana, de 18 anos, pega ônibus todos os dias para o Centro do Rio, onde faz o curso de vídeo que conseguiu através da escola. Frequentemente, ela é agredida verbalmente por motoristas e passageiros, que lhes dizem que estudantes ficam passeando e atrapalhando a vida dos trabalhadores. “Isso é um desrespeito com o estudante que acorda cedo pra ir à escola ou curso.”

Algo que nunca será esquecido por Aline da Rosa de 19 anos é a humilhação que um motorista a fez passar porque teve problemas na hora da liberação da roleta. “Ele desligou a ônibus e falou que só ia sair do ponto quando eu descesse do carro, me tratou como um cão, eu tive que descer”.

Existem muitos relatos, muitas verdades e muitos questionamentos, mas além de tudo isso, existe um fato incontestável. A sociedade que deveria dar o exemplo de cidadania fica no meio do caminho entre a impunidade, a indiferença e a revolta. E é essa mesma sociedade que terá que responder por essa geração que trava todos os dias essa luta pelo simples direito de aprender muito mais que as lições da escola... Aprender que direito nem sempre é uma conquista e chegar à escola é mais que uma rotina diária, é uma caminhada em busca da dignidade.

2 Comentários:

Louise Teixeira disse...

Discussões sobre o Passe Livre Secundarista parecem eternas.

O RioCard e a nova Conexão Aluno (a repudiada coleira eletrônica) são limitações a um direito já adquirido, e estas limitações só beneficiam as empresas de ônibus QUE SÃO ISENTAS DE IMPOSTOS PARA CARREGAR GRATUITAMENTE IDOSOS, PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS E ESTUDANTES DA REDE PUBLICA.

A passagem do estudante já está paga. Quem não sabe disso e reclama dele estar sentado está errado duas vezes: só porque ele “não paga” passagem ele é menos humano e tem de ir em pé sempre no transporte público??

Pré adolescentes baderneiros nós também temos na rede particular e “pagantes”, não sejamos hipócritas e preconceituosos.

Qualquer forma de restrição do passe-livre é veementemente repudiada pelos estudantes e os tais cartões nos remetem à época da ditadura, onde os estudantes eram vigiados de perto pelos governantes.

Quando entendermos que é um direito garantido por lei e, principalmente que ninguém e melhor que ninguém – afinal, ninguém pega ônibus porque é divertido, e sim por necessiidade – o Brasil será melhor, a Educação Pública também e ninguém se irritará com o próximo no ônibus, seja ele quem for.

Aline Rosa disse...

Tuany ficou muito bom essa materia adorei o jeito que você abordou a materia muito boa mesmo
gostaria de ressaltar que algum dia teremos formas veridicas de mostrar isso de forma gravada em tempo real entedeu desde de ja agradeço por voce ter feito essa materia tenho certeza que muitos estudantes estao felizes.

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