por Yasmin Thayná
Foi-se o tempo em que velhice era sinal de fim da vida: esperar os últimos dias para falecer. Prova disso é Dona Maria Aparecida Alves, de 113 anos de história.
Por um instante, no evento, parecia que alguém de muita importância havia entrado no espaço, pois todos se levantaram e o silêncio de respeito tanto de quem falava lá na frente quanto de quem ouvia, parecia ensaiado. Quando os olhares se voltaram para a entrada, vinha andando em passos de uma dama, com as saias balançando, uma importante pessoa: Dona Maria chegou!
Serena, com boa memória e fala tranquila, segue sua vida com fé em Deus. “É ele quem me abençoa. Eu cheguei até aqui por causa dele.”
Os problemas dela não impedem a continuidade de transmissão de sabedoria, paz, tranquilidade, sorriso no rosto e humildade. “É o que eu mais faço. Eu tenho prazer em receber as pessoas na minha casa e conversar.”
É uma tarefa difícil e longa a ser relatada quando se quer saber sobre a vida de uma mulher que viveu no campo muitos anos.
De uma família simples, Dona Maria foi da cidade mineira de Rochedo até São Paulo a pé com seus parentes. E aos 12 anos de idade, chegou à Nova Iguaçu, lugar onde vive até hoje. “A cidade ainda era um campo de boi. Maxambomba era um enorme laranjal,” lembra.
Diante de uma vida difícil, a moça, que já não tinha seu pai, tinha que andar quilômetros a pé, junto a sua mãe e seus irmãos, para contornar a total carência de transportes coletivos. "Durante três meses andava seis horas de minha casa até a serra de Tinguá, onde colhia madeira para ter lenha para uso doméstico."
Dona Maria lembra também do tempo das guerras mundiais. “Às 6 horas da noite, todo mundo em casa. Depois desse horário, não tinha ninguém nas ruas.”
Dona Maria jamais esqueceu o dia em que viu a mãe, a congolesa Inácia Esperança Alves, parindo um de seus irmãos. "A gente vivia na chácara do Seu Simão", conta ela, que dormia em um espaço nos fundos da propriedade. Quando a mãe começou a sentir as dores do parto, acompanhou-a até a parteira Maria Fernandes. "Minha mãe estava ardendo de febre."
A mulher mais velha do Rio de Janeiro também se lembra das caminhadas que dava para chegar em Tinguá, mais precisamente na estrada do Iguaçu Velho, para enterrar seus irmãos de cor. "Era lá que ficava o cemitério dos escravos mais próximo", conta.
A precariedade das favelas cariocas é uma extensão do período em que dona Maria dormia no chão coberto com folha de bananeira seca. "Não tinha cobertores para a gente se aquecer", lembra. Os irmãos dormiam todos no mesmo cômodo e um dia quando acordou, um deles, José Maria, estava morto. "Fizemos um caixão com madeira de caixote de frutas, colocamos o corpo do menino e levamos na cabeça até o cemitério."
Dona Maria viu a igreja de Santo Antônio, a principal da cidade, sendo construída. "O Padre João ia pelas ruas convidando todos a participarem da missa, que ele rezava a céu aberto, em bancos fabricados pelo próprio povo." O mais curioso desse relato é o episódio em que o padre amaldiçoou o bairro de Adrianópolis, antiga Painera, depois de ser apedrejado pelo povo que ajudava. “Você pode ver que Adrianópolis não cresce de jeito nenhum. Cresce mínimo, mínimo. Em relação ao que Nova Iguaçu era quando cheguei aqui e o que é hoje, Adrianópolis não cresceu nada.”
Essa senhora é muito querida por todos os vizinhos do bairro. A estrela do dia era dona Maria, que reconhecia e abraçava godos que passavam. Era um amor imenso. O carinho que ela tem pelos outros e eles têm por ela, é sem tamanho.
“Um dia eu fui lá na Casa de Cultura, e uns políticos me pegaram pelo braço para tirar foto comigo. Tem gente com raiva de mim até hoje por isso. Não entendi. Eu estava lá sentadinha prestando atenção na festa e me chamaram. Eu fui e ficaram com raiva de mim por causa disso”, disse inconformada.
Todo relato é pouco diante de uma mulher analfabeta que aprendeu o que há de mais bonito, que é conviver com os outros a despeito de todas as suas dificuldades. Após de ter passado frio, fome, ter andado horas pela estrada em busca de trabalho, comida, ajuda. De ter vivido com seus irmãos durante seis meses sozinha depois que sua mãe veio a falecer. "Mesmo com tudo isso, não me canso de dizer que sou feliz, que não tenho nada a reclamar, que apesar dos meus problemas de saúde ando, falo, tenho casa e comida, amor e Deus". Dona Maria conquistou seus espaços e afirma o que mais faz: agradecer a Deus por hoje ter esse carinho todo que lhe dão e a oportunidade de estar vivendo 113 anos.
8 Comentários:
aii que lindoo *-* me amarro em ver histórias assim de superação e longevidade !
Parabéns pelo texto !
Bya S.
ta muito legal isso aqui Yaya!
Linda história e belo texto.
Olhando para uma menina dessa, dá até força para não desistir da vida.
Um exemplo.
Acho que Deus existe mesmo, não é, Yasmin?...
Abçs e parabéns pelo texto, pelo engajamento!
Yayá parabéns. Ficou muito bom o texto e a história é excelente. Quero conhecer essa mulher hein!? ;D
essa velhinha aí tem 113 anos???
mentira deve ter uns 82 no máximo.
é marketing...
"Mesmo com tudo isso, não me canso de dizer que sou feliz, que não tenho nada a reclamar, que apesar dos meus problemas de saúde ando, falo, tenho casa e comida, amor e Deus".
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