Um canto pela liberdade

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

por Nany Rabello

Na primeira vez naquele lugar, não houve contato com eles. Eles são uma daquelas coisas que todo mundo sabe que existe, mas ninguém pode realmente dizer que viu. É quase uma lenda urbana. Até porque é como eles dizem no filme 400 contra um, exibido na última sexta-feira na Carceragem de Nova Iguaçu na estreia do projeto entre a SEMCTUR e a 52 DP: o Comando Vermelho não é uma Facção, é um comportamento.


Naquele dia, eles estavam lá. E é quase mágico estar assistindo a um filme sobre a história do Comando Vermelho dentro de uma cela com cerca de 170 homens do Comando ao seu redor. Mas a tela se confundiu com a realidade daquele momento no instante em que o filme ‘400 contra 1’ teve que interromper sua emocionante história, onde os presos da Lei de Segurança Nacional queriam os mesmos direitos que os que estavam presos por enfrentar a ditadura militar da década de 1970, para que fossem chamados os nomes daqueles que ganhariam liberdade naquele dia.

Forma apenas dois nomes – e um deles tinha chegado naquele mesmo dia - mas a festa foi tanta que parecia que todos eles estariam livres a partir daquele instante. Depois que os dois homens juntaram suas coisas, receberam alguns abraços e deixaram a cela, foi que a realidade se tornou confusa e uma cena histórica se iniciou.

Após um grito de “coletivo na escuta?” dado pelo homem à frente de todos os outros, a resposta em couro ecoou pelas paredes da Carceragem da 52° DP de Nova Iguaçu. “Na escuta!” Foi a resposta em uma só voz dada pelos demais homens a cada vez que a pergunta era feita. Depois de anunciar seu nome e o artigo do Código Penal que o mantinha preso ali, o homem que iniciou o coro começou algo - meio canção, meio oração – cantando pela liberdade daqueles que deixaram a cela.

‘Liberdade, Justiça e muita Fé em Deus’ é quase um mantra que aqueles homens repetem tanto para si mesmos como para os demais, cantando pela liberdade e por amor ao seu Comando vermelho. Um canto que após terminar com um pedido à liberdade: me chama que eu vou!, é repetido uma vez para cada amigo que saiu em liberdade.

Não é apologia ao crime organizado, nem julgamento de inocência ou culpa. É apenas admiração por homens que cantam por uma liberdade que não lhes pertence, talvez por que se alegram por aqueles que a têm, ou talvez para que ela lembre que eles ainda estão ali, à sua espera. São homens que cantam a liberdade, e não a prisão. Coisa que muita gente que está do lado de fora das celas não pensa em fazer. São homens do Comando Vermelho, mas são homens. Homens que assinam. Cantar pela liberdade... alguém assina?

1 Comentários:

Anônimo disse...

Ouvi esse canto por um audio e hoje vim buscar a origem, e vc me esclareceu bem de onde surgiu

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