por Nany Rabello
Era uma quinta-feira, às nove da manhã, e eu ouvi alguém dizer que sabia que aquele seria um dia bom. Foi nesse exato momento que cheguei à Carceragem de Nova Iguaçu. Ia acompanhar a Oficina de Teatro Institucional, aplicada por Jitman Vibranovski e Paulo Antunes na 52° DP.
Faz dois anos que esse projeto estava para ser implantado aqui em Nova Iguaçu. No inicio de tudo, eles foram até as celas e explicaram como seria, e convidaram a todos para participar. A maioria disse que parecia ser muito legal, mas estava torcendo para não estar lá para participar das oficinas. Hoje a história é diferente. Quem é liberado já sai pedindo autorização para continuar fazendo as aulas, tamanha a paixão despertada neles.
Jitman ainda se lembra discurso do primeiro dia. “Não somos pastores, nem advogados, não estamos aqui para saber quem fez ou deixou de fazer o quê, nosso trabalho não é esse. Viemos fazer teatro. E esperamos que vocês também façam.” Como o trabalho com eles começou no dia 1° de Abril, o dia da mentira, o primeiro exercício foi convencer os atores de uma mentira que eles quisessem contar. E assim começou a magia do teatro.
Agora, já no sétimo encontro dos doze previstos pelo convênio entre o Teatro Institucional, a Secretaria de Cultura de Nova Iguaçu e o MinC, não são apenas cinco os presos que entram na tão querida sala de teatro da 52° DP: são doze. Os próprios detidos convidam-se para assistir e participar da oficina. “É um momento de escape. A gente pode ser tudo o que quiser e falar sobre tudo, sem ser julgado”, conta um dos detentos.
Entre exercícios vocais, alongamentos, mímicas, esquetes e explicações técnicas sobre peças e interpretação, ainda sobra tempo para uma conversa, onde o maior aprendizado acontece. Nessa conversa, os atores perguntam como foi a semana, o que eles leram, quais as boa notícias que chegaram, e deixam que eles falem sobre tudo que precisarem falar. "A arte ajuda a formar o cidadão, expandir seus conhecimentos. A arte vem pra que eles descubram outras possibilidades como ser humano, resgatar o cidadão neles, seus próprios sentimentos, seus medos, suas angústias, e tudo que eles precisarem se lembrar - ou se livrar", diz Jitman, que explica que essa conversa é o momento de descobrir qual o bem que o teatro está trazendo para suas vidas. É nesses momentos que eles declaram, unanimemente, “como é bom ter um espaço pra fazer qualquer coisa, que não seja estar lá”.
Verdade dentro deles
Quando começaram o trabalho com as pessoas-que-não-têm-cadeira, os atores sabiam qual seria a palavra mais trabalhada com eles: liberdade. E por isso é necessário que eles estejam de peito aberto, sem medo de julgamentos, na hora da oficina. “Não quero que eles se acanhem em momento algum”, diz Jitman. Fazendo teatro com músicas, figurinos, fatos do dia-a-dia dos presos, e, é claro, histórias, que mudaram a história de muita gente. “Houve um exercício em que eles tinham que contar uma história e eles só tinham uma cadeira para isso. Todos contaram a história sentados. Até que eu disse ao último ator que ele não precisava sentar, podia contar do jeito que quisesse. Ele deu uma volta na cadeira, pensou, e disse: ‘quer saber? Eu vou sentar sim. Faz tanto tempo que não sento numa cadeira...’ Lá dentro eles não têm cadeira. A gente não imagina nossa vida sem cadeira, é uma coisa tão simples, tão comum. Mas com eles é tudo diferente. E a gente passa a valorizar mais a cadeira da gente”, conta Paulo.
Quando começaram o trabalho com as pessoas-que-não-têm-cadeira, os atores sabiam qual seria a palavra mais trabalhada com eles: liberdade. E por isso é necessário que eles estejam de peito aberto, sem medo de julgamentos, na hora da oficina. “Não quero que eles se acanhem em momento algum”, diz Jitman. Fazendo teatro com músicas, figurinos, fatos do dia-a-dia dos presos, e, é claro, histórias, que mudaram a história de muita gente. “Houve um exercício em que eles tinham que contar uma história e eles só tinham uma cadeira para isso. Todos contaram a história sentados. Até que eu disse ao último ator que ele não precisava sentar, podia contar do jeito que quisesse. Ele deu uma volta na cadeira, pensou, e disse: ‘quer saber? Eu vou sentar sim. Faz tanto tempo que não sento numa cadeira...’ Lá dentro eles não têm cadeira. A gente não imagina nossa vida sem cadeira, é uma coisa tão simples, tão comum. Mas com eles é tudo diferente. E a gente passa a valorizar mais a cadeira da gente”, conta Paulo.
Eles se entregam tanto ao trabalho que é fácil ouvir comentários como “Puxa vida! Parece que está acontecendo de verdade!” e “Eu me senti tão parte da história”. “Nós tentamos explicar que o teatro não é uma mentira, é uma verdade dentro deles", conta Jitman.
Cada oficina é mais que uma aula, é um lugar onde os presos se sentem livres e podem mostrar tudo de bom que têm dentro de si. Todos eles se apaixonaram pelo teatro, assim como os atores se apaixonaram pela história que é escrita semanalmente num palco invisível, mas protagonizada por pessoas de verdade. “Quando nós viemos trabalhar aqui achávamos que iríamos lidar com monstros. Então eles cruzaram a porta e veio a surpresa: eram só pessoas!”, contou Jitman. “Eu nunca pensei sobre a diferença que uma cadeira faria na minha vida. Eu tenho cadeiras, não é tão importante assim. Mas na deles faz. Eu não conseguiria ser uma pessoa sem cadeira”, conta Paulo. E os dois amigos-atores, Paulo e Jitman, vão continuando seu trabalho com as pessoas que podem não ter cadeiras, mas têm sonhos, sentimentos e vida, como todo ser humano.
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