Artesão e filósofo do Ceará

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

por Yasmin Thayná

Ao passar pela rua do Hospital da Posse, próximo a entrada do Bairro de Ponto Chic, é possível ver uma sutil loja com sandálias feitas a mão penduradas e um senhor de cabelo branco sentado na frente.
O ponto de interrogação que fica na cabeça de qualquer passageiro curioso e limitado por um vidro e uma escada, agora, é um tesouro descoberto tornando-se um ponto de exclamação com lindos textos gigantes anteposto a pontuação. Seu Francisco é um artesão Cearense, de 61 anos que iniciou sua carreira fazendo chinelos para ele mesmo na sua meninice lá na cidade de São Benedito. Aos 15 anos, sua mãe Margarida com idade de 85 e que viveu durante 35 anos no Ceará, o convida para morar no Rio de Janeiro, em Nova Iguaçu. Ao enfretar certa dificuldade em conseguir um emprego digno, optou por ser um artesão, o que somo hoje 30 anos de trabalho. Participando do movimento hippie dos anos 70, aproveitou o seu estilo de vida e incluiu o artesanato, assim como os outros hippies, na sua atividade lucrativa.
O monstro imutável, o tempo, fez com que as funções físicas de seu Francisco se limitasse, o que tornou fixa e definitiva a ideia de se estabelecer em uma loja que ficasse próximo a sua casa: no primeiro andar. "Carregar peso, enfrentar chuva e sol... O lucro de estar nas feiras hippies era bom mas era uma fantasia," disse se referindo a sua juventude.
De forma séria, porém, descontraída, o senhor conta da vez em que foi a Muriqui e uma menina jovem de 15 anos de família rica surgiu em sua barraca o ajudando a atender os clientes. "Eu pensei no final do dia, vou dar uma sandália para ela. Pedi para a menina tomar conta da barraca para que eu pudesse tomar banho. Voltei. Dei uma sandália a ela. Mas ela não queria ir para casa. Fechei a barraca e fui jantar em uma churrascaria. Quando eu fui jantar, ela me convidou para jantar com ela. Eu fui. Aí parou ao nosso lado um carro mais caro da épica, um Pelina, aí um senhor chamou a menina. Eu disse que ela tinha passado o dia comigo. Ele me perguntou onde eu estava e eu disse que levaria a menina na rua Rio de Janeiro. E ainda disse para ele: não recrimine a sua filha. Ela gostou da técnica e ficou me olhando fazer."
2 horas é o tempo que ele dedica para fabricar uma sandália desenhando antes e medindo corretamente. Dependendo das vendas, vai ao bairro da Penha, na zona norte ou em Madureira, na zona , onde econtra o couro com um preço reduzido. "Aqui em Nova Iguaçu ainda não existe casa de couro. Eu tenho que me deslocar até lá."
Já o pneu que é utilizado como solado das sandálias, ele vai às borracharias e troca 4 ou 5 pneus a dez reais; o que equivale à 4 pares e, ainda, 20 ou mais anos de vida útil aos calçados desenhados e feitos pelas mãos de seu Francisco.
Além disso, também faz chapeus, cintos e bolsas. Mas as sandálias, que variam de 10 à 50 reais, conseguem manter o sustento de sua casa durante o mês.
A inovação dos modelos de calçados são trazidos da Flórida onde sua irmã, bem sucedida, mora. Vindo eventualmente ao Brasil, traz novidades para a loja do irmão.
No auge de sua carreira, seu Francisco com seu sotaque nordestino disse que recebeu uma denominação dada pelas testemunhas de Jeová o que fez levar a sério o estudo bíblico. "Eu tinha o carro do ano, muitas namoradas e drogas. Eu achava que aquilo era correto. Eu não tava matando nem roubando ninguém." O estudo o fez entender as limitações que a vida impõe.
Além de artesão e religioso, seu Francisco é um operário que protesta: "Se existe Haiti, aqui é pior. A gente é cercado de lama, barata, ratos e doenças. Você olha e vê um monte de criança brincando no meio da vala. E o Presidente entregando o país a uma presidenta do mesmo partido, com um Brasil cheio de riquezas: pretóleo, pré sal etc. Meninas que fazem programas à 10 reias, filhos sendo vendidos a 10 reais. Pobreza no nordeste. Falta de emprego. Viu que hipocrisia vivemos? Dá pra viver em um mundo como esse?"
E ainda contesta a exclusão que o Brasil sofre:
"A tecnologia engana a gente. Os produtos que são fabricados na China e nos Estados Unidos hoje só serão entregues daqui há 10 anos. Poderia vir hoje. A gente não vive em um planeta? O Americano é superior ao brasileiro em quê? Inteligencia? Quantas pessoas inteligentes tem no Ceará?" finaliza.

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