porJefferson Loyola
O candomblé tem raízes milenares e chegou ao Brasil pelas mãos dos escravos vindos da África, trazidos pelos portugueses. Naquela época, o candomblé foi proibido e até 1946 foi considerado crime. Para continuarem cultuando sua religião no Brasil, os escravos tiveram que usar o sincretismo dos orixás (guardião de cada existência humana) com os santos católicos, colocando no mesmo altar Ogum e São Jorge, Oxum e Nossa Senhora da Conceição e Nossa Senhora Aparecida, Oxossi e São Sebastião, entre outros.
Durante todo esse tempo, só sabiam dos ritos que ocorriam dentro do Candomblé as pessoas que o freqüentavam, o que acabava gerando inúmeros mitos sobre o que acontecia dentro dele. Os rituais religiosos eram passados de Babalorixás (Pais de Santo) ou Iyalorixás (Mães de Santo) para os filhos que frequentavam o Ilê (casa de santo ou terreiro). Porém, as coisas foram evoluindo e a maneira de se passar tradições religiosas mudaram, coisas que eram passadas apenas oralmente de pai para filho, agora também são passados a partir da escrita e do audiovisual.
Um grande exemplo disso é a escritora e Iyalorixá Giséle Omindarewá Crossard, 87 anos, que publicou vários livros divulgando a religião afro-brasileira, como “Awô: O Mistério dos Orixás”. Publicado em 2007 pela editora Pallas, suas 216 páginas relatam os mitos e lendas dos orixás, os rituais sagrados dentro do ronkó (quarto de santo onde se recolhem as pessoas para obrigações de tempo de santo ou iniciação) e outros detalhes desta religião que para muitos ainda é um mistério e que por isso é alvo de muitos preconceitos.
Primeira estrangeira a se tornar mãe de Santo no Brasil, sua trajetória se iniciou no final dos anos 60. Na época esposa de um embaixador francês, ela foi a uma festa de candomblé a convite de sua empregada, em Duque de Caxias. Era dia 5 de dezembro de 1959 e na noite anterior o terreiro fizera uma festa em homenagem a Oyá (orixá feminino, dominadora dos raios, ventos e tempestades). Giséle era católica e não tinha nenhuma ligação com a cultura africana, mas desde o momento que entrou naquele lugar soube que dali para frente sua vida seria diferente. “Quando os ogãs tocaram para Yemanjá, eu me senti estranha e fui parar no chão, sem consciência”, conta ela em entrevista por e-mail.
Bolada
Giséle havia “bolado no santo” (quando um determinado orixá escolhe e mostra para todos os presentes que você está sendo indicada para ser iniciada). “No início resisti, mas, após constantes dores de cabeça, acabei cedendo”, lembra. Assim, ela foi iniciada no santo pelo famoso Babalorixá Joãozinho da Gomeia. Após 21 dias de recolhimento dentro do ronkó, nasceu para outra vida e dentro da casa de santo deixou de ser conhecida como Giséle para ser chamada por sua digina (nome dado à pessoa quando se inicia para o santo): Omindarewá, que significa “água límpida”.
Giséle se separou, passou uma temporada na França e em 1972 voltou para trabalhar como conselheira pedagógica do Serviço Cultural Francês. Quando voltou, Joãozinho já havia falecido há um ano e a ex-embaixadora estava decidida a manter-se afastada do santo. Entretanto, sofreu um grave acidente de carro e foi levada pelo antropólogo Pierre Fatumbi Verger, igualmente francês e ligado ao santo, à casa do babalorixá Balbino Daniel de Paula, que se propôs a ajudá-la. Onze dias depois do acidente, era aniversário de seu santo e ele fez questão de preparar oferendas a Yemanjá – seu santo de cabeça. Mesmo sem poder se mexer, o orixá veio e dançou em seu corpo, deixando Balbino encantado por seu santo.
Ela acabou dando continuidade de sua vida de santo com Balbino de Xangô e hoje tem uma casa de santo chamada “Ilé Àsé Ìyá Atara Magba”, na Rua Almirante Tamandaré, nº 8, Parque Eqüitativa, localizado em Santa Cruz da Serra. Michel Dion lançou um livro falando sobre ela, também da editora Pallas, que se chama “Omindarewá: Uma francesa no candomblé”. E este ano estreou o filme "Giséle Omindarewá", na Maison de France (RJ), um evento inserido nos festejos do ano da França no Brasil.
Candomblé à francesa
segunda-feira, 9 de novembro de 2009
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